segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Atlas da Exclusão Social - Dados Relevantes

Os interessados em indicadores mais substanciais sobre a exclusão social no brasil e no mundo, como o índice de gini, citado no post anterior, entre outros dados relevantes, cita-se cinco obras da cunha de Márcio Pochmann e outros, os chamados Atlas da Exclusão Social, da Editora Cortez.

As referências bibliográficas das obras são:

1)
POCHMANN, M. (Org.) ; AMORIM, Ricardo (Org.) . Atlas da Exclusão Social no Brasil. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2003. v. 1.

2)
POCHMANN, M. (Org.) ; CAMPOS, A. (Org.) ; AMORIM, Ricardo (Org.) ; SILVA, Ronnie (Org.) . Atlas da Exclusão Social no Brasil - Dinâmica e Manifestação Territorial. São Paulo: Cortez, 2003.

3)
POCHMANN, M. (Org.) ; CAMPOS, A. (Org.) ; AMORIM, Ricardo (Org.) ; SILVA, Ronnie (Org.) . Atlas da Exclusão Social: Os Ricos no Brasil. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2004. v. 3.

4)
POCHMANN, M. (Org.) ; CAMPOS, A. (Org.) ; BARBOSA, A. (Org.) ; AMORIM, Ricardo (Org.) ; SILVA, Ronnie (Org.) . Atlas da Exclusão Social: A Exclusão no Mundo. São Paulo: Cortez, 2004. v. 4.

5)
POCHMANN, M. (Org.) ; BARBOSA, A. (Org.) ; SILVA, Ronnie (Org.) ; PEREIRA, M. A. (Org.) ; PONTE, V. (Org.) . Atlas de Exclusão Social - Agenda não Liberal da Inclusão Social. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2005. v. 5.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Alto Desenvolvimento Humano?

Nos últimos dias o Brasil ficou sabendo que, de uma hora para outra, transformou-se num país de elevando desenvolvimento humano. Num passe de mágica, saímos de incomodo nível médio de desenvolvimento, e evoluímos para um país com respeitáveis indicadores socioeconômicos. Há muita coisa por trás de indicadores, e o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) não foge a regra.

O Cálculo do IDH

Segundo o ótimo site do Pnud Brasil (sigla em português para Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), o IDH, criado pelo economista paquistanês Mahbud ul Haq, com colaboração do indiano e também economista Amartya Sen, é mensurado medindo dados sobre PIB per capita, longevidade e educação. A renda é quantificada em dólar, pelo método da Paridade de Poder de Compra (PPC), que calcula a capacidade aquisitiva de uma unidade da moeda americana em cada país, ou seja, o que se consegue comprar com 1US$ nas nações mundo afora. A longevidade é auferida pela expectativa de vida. Os indicadores da educação são, a alfabetização e a taxa de matrícula em todos os níveis de ensino (no Wikipédia encontrei de forma mais detalhada o que significa essa taxa, que é uma divisão entre o número de pessoas que estão estudando, não importa o nível – fundamental, médio e superior - e a idade, pelo número de habitantes que um país têm entre os 7 e 22 anos, que são, aproximadamente, o início do primário e término da universidade).

Algumas Críticas

A divulgação do último relatório do Pnud colocou o Brasil em último no grupo de 70 países com alto desenvolvimento humano que, numa escala que vai de 0 a 1, têm IDH igual ou maior a 0,800. A lista das nações com elevados indicadores socioeconômicos é encabeçada, por Islândia, Noruega e Austrália. Mas o Brasil pode ser comparado a alguns desses países? É possível estabelecer um cotejo com Espanha, França, Alemanha, Itália, ou até mesmo Grécia, Coréia do Sul e Israel? A única maneira possível é ter essas nações como exemplo, meta.

Toda tipologia têm seu problema. Ao separar o IDH em três grandes categorias – baixa, média e alta - a ONU (o Pnud é um programa ligado a essa entidade) peca pelo alto nível de agregação dessa classificação, a ponto de colocar o Brasil no mesmo conjunto de países que são tradicionalmente reconhecidos pela qualidade de vida, ou de emergentes, não apenas no sentido econômico, mas que apresentaram sensível melhora nos índices compreendidos pelo IDH, tais como Coréia do Sul, Espanha, Singapura e a Irlanda, que era uma das nações mais pobres da Europa Ocidental nos 70, e hoje tem o quinto melhor Índice de Desenvolvimento Humano do planeta. Creio que categorias mais rígidas poderiam diminuir a agregação da classificação, e dar um tom mais realista ao relatório do Pnud.

O próprio calculo do IDH deveria levar em conta dados importantes que denotam muito sobre a qualidade vida. Um deles é o Coeficiente de Gini, desenvolvido pelo italiano Corrado Gini, mede a distribuição de renda nas nações, numa escala que vai de 0 a 1. Quanto mais próximo de zero, menos desigual será a partilha das riquezas em um país. Como sabemos, o Brasil tem uma vergonhosa concentração de renda, contudo isso não afeta o cálculo do índice, pelos menos diretamente. Segundo o site oficial do Pnud (este em inglês), os campeões em desenvolvimento humano na América do Sul, Argentina e Chile, apresentam terríveis padrões de desigualdade de riquezas, pouco melhores que o nosso. Já o Uruguai, campeão nesse quesito no subcontinente, tem apenas o terceiro IDH, muito provavelmente porque a equação do indicador não leva em consideração essa importante dimensão do progresso socioeconômico.

Certamente, existem estatísticas relevantes que podem denotar muito sobre a qualidade de vida num país. Vou enumerar apenas mais uma, a segurança pública. Como o Brasil poder ser considerado um país com alto desenvolvimento humano tendo índices tão alarmantes de violência? Ainda fazendo uso dos dados encontrados no site oficial do Pnud, verifiquei que, em termos de homicídios por 100.000 habitantes, estamos perdendo feio para nações com IDH menor que o nosso. A Bolívia (IDH 0,695) apresentou 2,8 assassinatos para cada centena de milhar, o Equador (IDH 0,772) registrou 18,3 e o Peru (IDH 0,773) 5,5. Já o Brasil (IDH 0,800), segundo fontes do IBGE para o ano de 2001, apresentou 27,84 homicídios por 100.000 habitantes. É inegável que baixos índices de criminalidade são essenciais para o progresso social. Porém, o índice de desenvolvimento humano não consegue captar (pelo menos diretamente), analisando apenas indicadores de renda, educação e expectativa de vida, o impacto que a falência da segurança pública tem na vida dos brasileiros, especialmente os mais pobres.

Entretanto, acredito que não podemos jogar fora o IDH, até porque o índice compreende dimensões importantíssimas para auferir a qualidade de vida num país. Contudo ele não poder ser definitivo, no sentido que estatísticas que não sejam abarcadas pelo indicador tenham um valor secundário para medirmos o desenvolvimento humano. Até que a equação utilizada pelo Pnud leve em conta outros fatores, o relatório de 2007(e outras estatísticas) serviu para mostrar uma coisa que estamos cansados de saber, precisamos fazer muito!

Os sítios eletrônicos citados no texto são ótimas fontes de pesquisa e trazem uma infinidade de dados para entendermos melhor o Brasil e o mundo. São eles:

United Nations Development Programme: www.undp.org

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento: www.pnud.org.br

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística: www.ibge.gov.br

domingo, 2 de dezembro de 2007

Proposta para pensar e debater

Devido a CPMF a reforma política foi esquecida. Enquanto a democracia vai para o espaço em alguns vizinhos, segue uma simples proposta para discussão, que pretende aperfeiçoar a nossa democracia, que apesar de todos os defeitos, ainda está com os pés no chão.

Separação das eleições executivas e legislativas

Eleições para o poder executivo (presidente, governadores e prefeitos).

Mandato de cinco anos, sem reeleição.

Verticalização das alianças. As legendas terão um arco de alianças possíveis nas unidades subnacionais. O partido que não se coligar com ninguém, não poderá coligar-se com outra organização em nível estadual e municipal.

Possibilidade de segundo turno em todos os municípios, independente do tamanho de seu eleitorado.

Eleições para o poder legislativo (senador, deputado federal, deputado estadual e vereador).

A estrutura dos mandatos continua a mesma.

Cláusula de barreira de 5% das cadeiras e não dos votos, tendo como referência o congresso nacional. Implicações: Não terá direito a propaganda de rádio e televisão. Não poderá lançar candidatos a cargos executivos. Não poderá presidir instituições legislativas nem presidir comissões parlamentares, em quaisquer níveis.

Explicando um pouco melhor a cláusula de barreira.

O partido ultrapassará a cláusula se tiver mais de 5% das cadeiras do Congresso Nacional, ou seja, somando Câmara e Senado. Por exemplo, 26 deputados e 4 senadores. Estou levando em conta aqui o potencial de coalizão (chantagem ou bloqueio) dos partidos. Como a eleição proporcional no Brasil é bem deformada, um partido pode fazer 5% dos votos e não conquistar a mesma proporção de cadeiras. Devido a essa deformação, a capacidade de um partido integrar uma coalizão ou fazer uma oposição digna do nome, é medida pelo seu peso no parlamento e não tanto pelos votos. Creio que alguns estados não vão querer diminuir em oito vezes sua representação, por isso essa idéia continua levando em conta tal deformidade.

Fim das coligações nas eleições legislativas, e não apenas proporcionais. O suplente do senador só poderá ser do mesmo partido que ele, pois esse mandato também pertence ao partido.

Regras para as duas eleições

Fidelidade partidária. O político só poderá trocar de partido faltando 6 meses e não 1 ano antes do pleito, seja qual for a situação. Situações possíveis: o legislador vai tentar a reeleição ou outro cargo legislativo. O parlamentar vai concorrer a um cargo executivo. O ocupante de um cargo executivo vai concorrer a um cargo legislativo, ou a outro cargo executivo.

Financiamento público. Somente público. Os partidos que não atingirem a cláusula de barreira terão que ratear apenas 1% do dinheiro disponível. Os outros 99% serão divididos pelas legendas que ultrapassarem a cláusula. Porém não serão divididos em partes iguais, mas sim levando-se em conta o peso proporcional de cada partido entre aqueles que superaram o desempenho de 5%.

Outras considerações

Nesse modela haverá coincidência das eleições a cada 20 anos.

Também proponho a realização de um plebiscito para trocar o regime político brasileiro. As opções seriam a continuidade do presidencialismo ou a implantação do semipresidencialismo, com a indicação de um primeiro-ministro pelo partido que conquistar o maior número de cadeiras no Congresso Nacional.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Tropa de Elite - Comentário à Reportagem "Universidade Reage ao seu papel em filme"

Conforme email enviado ao Painel do Leitor, publicado em 03/11/2007.

"Tropa de elite"

Na reportagem "Universidade reage ao seu papel em filme" (Cotidiano, 28/10), tentou-se demonstrar que a universidade reagiu ao papel atribuído a ela pelo filme "Tropa de Elite" utilizando como supedâneo entrevistas realizadas com graduandos e pesquisadores no 31º Encontro da Associação de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais. Eu fui um dos entrevistados, e, após ter lido a reportagem, alguns comentários devem ser feitos e esclarecimentos prestados. A jornalista Michele Oliveira sustenta e, me citando, escreve: "É a visão do policial, totalmente estereotipada, de que o usuário de entorpecentes financia o tráfico". Essa frase dá um sentido no mínimo diverso daquele que foi dado quando da entrevista. O filme, de fato, apresenta um clichê, mas guarda certa e verídica conexão com a realidade quando trata dos usuários na universidade. Relembra que os usuários não estão apenas nas favelas e morros, como alguns querem crer, mas também nas universidades, e que esses financiam, sim, o crime organizado e o tráfico de drogas. Acredito, portanto, que o que o artigo defende vai na contramão da entrevista e contra uma realidade que não pode ser negada". LUCAS CASTRO , estudante de ciências sociais da Universidade Federal do Paraná (Curitiba, PR)

Íntegra do artigo, disponível somente para assinantes da FDSP.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Partidos, políticos, moral etc.

Artigo publicado na Gazeta do Povo, 11 out. 2007

Adriano Codato

“O PT, no fim das contas, era um partido igualzinho a todos os outros. Bastou chegar ao poder”... A banalidade dessa declaração sugere, contudo, uma verdade menos evidente.
Tão preocupados estivemos nos últimos anos em afirmar, ou acreditar na afirmação de uma verdade não política, que os agentes sociais pudessem ser simplesmente os portadores da ética, da moralidade, da honestidade, definidas sempre num registro muito vago, e esquecemos um conceito simples. Partidos políticos são máquinas eleitorais profissionais projetadas para ganhar eleições, exercer o poder, empregar filiados e implementar algo um tanto indefinível como “um projeto para o País”.
Partidos não são clubes literários, entidades beneficentes, associações de homens de boa-vontade ou organizações não-governamentais de grandes propósitos. Nem aqui, nem na China, para ser mais preciso. As transformações recentes na dinâmica política democrática impuseram a governantes, dirigentes, militantes, simpatizantes e ao público em geral algumas lições pouco edificantes: programas de governo não são escritos a partir dos estatutos do partido, mas em função de pesquisas de opinião; políticos colocam suas carreiras em primeiro plano ficando para um segundo momento definir que outros interesses vão, de fato, representar; eleições são os únicos mecanismos aceitos para controlar minimamente os representantes, já que é somente nesse momento que eles têm de se aborrecer com os eleitores.
Aqui as coisas talvez sejam um pouco caricatas, visto que as simpatias e as antipatias da opinião pública, aferidas segundo as mesmas técnicas de pesquisas com consumidores de bugigangas, comandam até a mudança de nome e sigla dos partidos. Os “Democratas”, um nome um tanto excessivo para a realidade que descreve, é só mais um exemplo de como as ideologias (os sistemas de idéias) ou significam nada, ou significam exatamente isso: idéias abstratas sem nenhuma correspondência com o mundo sublunar. Que o PT tenha insistido em seu último congresso em se autodefinir como um partido “socialista” revela mais sobre como os dirigentes julgam nossa capacidade de julgá-los do que sobre a idéia um tanto larga que eles próprios fazem do socialismo como doutrina e como prática.
O mais novo emplastro aplicado pelo STF ao sistema político nacional é a “fidelidade partidária”. Políticos que se elegem por uma agremiação e transferem-se para outra correm, em tese, o risco de perderem seus mandatos.
Praticamente tudo já foi dito nos últimos dias sobre virtudes e defeitos da decisão. Os otimistas, como de hábito, sustentaram que agora, enfim, a coisa anda: a medida apressa a reforma política, disciplina o jogo partidário, inibe comportamentos auto-interessados, exige uma adequação entre candidaturas e orientações doutrinárias. Os mais realistas ponderaram que as mudanças de sigla poderiam, em poucos casos é verdade, ser comandadas pelas infidelidades do partido ao seu programa; ou que, no fim das contas, tomado esse movimento na devida perspectiva, a série histórica de migrações partidárias mostraria que se há, de fato, muitas movimentações, elas na verdade se dão dentro do mesmo espectro ideológico: políticos de partidos de direita migram para partidos de direita, políticos de partidos de centro migram para partidos de centro e assim por diante.
Parece-me, entretanto, que o argumento fundamental para questionar não a eficácia, mas a validade de uma medida restritiva como essa não vem da “judicialização da política” (isto é, a intromissão do Judiciário num assunto que não lhe diz respeito) ou do fato da interpretação da doutrina criar uma nova doutrina. Vem da questão mais incômoda: o mandato pertence aos partidos; mas que partidos? Dado que as organizações partidárias são elas mesmas fracas, pouco disciplinadas, sem um programa ideológico claro, divididas regionalmente em grupos pouquíssimos parecidos entre si, em nome de quais princípios se poderia exigir “fidelidade”?
O sistema político brasileiro está condicionado por uma lógica partidária ao mesmo tempo simples e difícil. Simples na forma porque, efetivamente, só existem à disposição dos executivos, dos políticos profissionais e dos eleitores dois partidos: o partido do governo atual e o partido daqueles que não compõem – ainda – o governo atual (“partido da oposição” seria um nome exagerado na conjuntura atual para descrever aqueles que estão, por ora, fora da coalizão). Difícil de ser manejada porque como existem, legalmente, dezenas de partidos, a formação do “partido do governo” implica em muitas práticas pouco republicanas, para utilizar a expressão da moda: aliciamentos, concessão de favores, empreguismo oficial, clientelismo parlamentar, manipulações do orçamento etc.
Dado esse contexto institucional (fragmentação partidária), dado esse mecanismo de obtenção de apoios (cooptação) fica difícil exigir “fidelidade” sem implodir o sistema e aumentar para o governo os custos de transação: conseguir apoios ficará não só mais complicado, mas mais caro para todos – e para nós principalmente, que pagamos a fatura.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Pró-alcoól e trabalho escravo

A discussão sobre os biocombustíveis, os com bustíveis não poluentes e renováveis está num patamar internacional com destaque ao produto brasileiro. Nos últimos meses, todos os lugares que o presidente Lula visitou foram assoberbados com um dircurso, um lembrete, uma nota de rodapé sobre a necessidade da produção dos combustíveis ecológicos e de como o Brasil poderia encabeçar isto.
Não tenho dúvida que o Brasil pode encabeçar este projeto. A cana-de-açucar produz mais combusível com menos substrato do que o milho (principal fonte de alcoól de cereal nos EUA) e as áreas de cultivo disponíveis em nosso país são amplamente superiores do que em qualquer outro território ao redor do planeta. Além do que, eu é que não vou ser contra o movimento ecológico.
Para além disto, a produção e exportação deste produto geraria emprego e renda para o Brasil. É justamente neste ponto que poucos falaram - o emprego de quem corta cana. O presidente Lula há pouco em seu discurso em Estocolmo salientou que a plantação de cana-de-açucar na Amazônia é inviável. Logo depois, na ONU, diz que o planejamento agroecológico para a produção de biocombustíveis já está atrasado. O Ministro da Agricultura, Reinold Stephanes, está com o céu em brancas nuvens. Nada de direito dos trabalhadores.
Até o momento apenas a Profa. Maria Aparecida de Moraes Silva se pronunciou sobre a questão do trabalho do plantio da cana.
Em artigo na Folha, a socióloga bem lembrou que a condição em que vivem os plantadores de cana e a rotina de trabalho dos mesmos é muito próxima da escravidão. Para termos apenas noção, basta saber que para cada tonelada de cana extraída são necessárias mil "facãozadas". O valor de cada tonelada de cana é de R$ 2,50. Quem produz pouco é chamado de "facão de borracha" ou "fraco" pelos colegas. Qualquer tentativa de reinvidicação ou resistência á exploração tem como consequência a dispensa do serviço. Para quem precisa dos 8 meses de colheita para sustentar a família que está longe por todo ano, a ameaça não é pequena. A "vida útil" de um cortador de cana é em média de 15 anos - se começar a trabalhar com 18, chega aos 40, no máximo. Segundo os anais da história, a vida últil deste trabalhador é inferior ao do escravo do Brasil colonial. Na região canavieira de São Paulo, de 99 a 05, tivemos 72 óbitos (fonte: MP e INSS).
Não resta dúvida que a política está desvinculada da sociedade, mas estamos deixando a vida de lado. A vida de quem sofre para que você possa gastar menos dinheiro ao abastecer seu carro dotado da tecnologia de ponta FLEX.

Sócrates, a revolução social futebolística e as quimeras populistas

[Crowded soccer fans. United
Kingdom, 1951. Cornell Capa. Life]


Fernando Leite

Há algum tempo atrás, recebi um e-mail de uma amiga numa dessas listas de discussões. O e-mail continha uma série de frases politicamente polêmicas; a maioria bastante engraçada. Uma delas, além de curiosa, parece-me trágica. Trata-se de (mais) uma proposta de "revolução", proferida por nosso Doutor Sócrates, sim, o mago dos campos tupiniquins "alegremente baldios" dos anos oitenta.

Trascrevo-a na íntegra, da mesma maneira que a recebi:

"Os mais conservadores e os reacionários têm um verdadeiro pavor da politização das torcidas. É que neste país nada mobiliza e agrega mais que o futebol e poderá ser por meio dele que teremos os exemplos que determinarão os caminhos que devemos seguir para transformar nossa sociedade em algo mais humano e da qual possamos nos orgulhar" (Sócrates, ex-jogador de futebol, Carta Capital, 13/03/3009).

Entendo o "argumento" de Sócrates da seguinte maneira: ele diz que os "conservadores e reacionários" têm medo da "politização das torcidas" supondo (1) que o futebol é o fator que mais "agrega e mobiliza" os organismos humanos desta República; (2) que um movimento social pode surgir dessas virtudes futebolísticas e (3) que tal movimento seria positivo, pois transformaria nossa sociedade incivilizada nalgo "mais humano" etc.

Em primeiro lugar, existe um veículo de difusão ideológica que pensa de forma semelhante a Sócrates, isto é, que acha que futebol é mais importante do que um bom sistema de ensino e políticas democráticas eficazes: a Rede Globo. Seria impossível contemplar a vasta quantidade de material empírico disponível para mostrar a crença (ou o rebuço) globista no "poder transformador" do esporte e, em especial, do futebol. Mas um evento é especialmente ilustrativo. Em 2 de junho de 2006, há poucas semanas da Copa do Mundo, a Globo dedicou um Globo Repórter ao tema. Como era de se esperar, a finalidade que orientava as matérias não se reduzia a apresentar o cotidiano dos craques, a celebrar o espetáculo e a pressionar por bons resultados (ainda que tudo isso esteja presente).

O fio condutor de todo o programa consistiu em uma comparação entre Brasil e Alemanha. Cada bloco do programa era dedicado a um desses países: um sobre o Brasil, o seguinte sobre a Alemanha, e assim até o fim do programa. Nunca vi uma manifestação tão perfeita de nosso eterno drama tupiniquim, que consiste em cultivar os valores e a realidade dos países avançados, projetados como ideais de um futuro próspero e reunidos sob a alcunha do "país do futuro"; enquanto tacitamente acreditamos que nossas disposições sejam intrinsecamente incompatíveis com ele. Assim, os blocos dedicados à Alemanha celebravam invejosamente os feitos sociais, tecnológicos, econômicos e culturais daquele país. Os blocos dedicados ao Brasil mostravam o rumo para o progresso: o futebol, que tanto salva jovens retirando-os da pobreza e oferecendo a oportunidade de "vencerem na vida"...

Consulte a matéria por si próprio:
http://grep.globo.com/Globoreporter/0,19125,VGC0-2703-10603-2-170919,00.html
http://grep.globo.com/Globoreporter/0,19125,VGC0-2703-10603-2-170917,00.html
(Ressaltamos a genial expressão Tino Marquiana, que conseguiu transformar "favela" e "habitação subumana" no eufemismo "campos alegremente baldios". Não consigo deixar de pensar que o raciocínio e as sensações que passaram pelo cérebro desse repórter da Globo são homólogos aos que acometem o Dr. Sócrates.)

Em segundo lugar, existe uma palavra que descreve perfeitamente no que consistem as frases de Sócrates (e seus análogos globistas): uma mitologia.

Ora, nosso país já possui problemas demais. Não precisamos que as torcidas se agremiem e se organizem politicamente. Já são tirânicas o bastante sem qualquer mobilização política. Já temos problemas demais do jeito que são. Caso se organizem, seu ímpeto de violência só se tornará mais destrutivo, pois os atos de violência seriam racionalizados, aumentando seu escopo e seus efeitos. Sua desorganização, embora seja mais um sintoma de sua boçalidade anárquica (e anti-republicana, anti-racionalista, irrascível, autoritária, intolerante...), garante que a violência se restrinja a conflitos difusos entre machos-alfa lutando por territórios.

As torcidas não são as massas de operários e de intelectuais orgânicos que conduziriam à sociedade de abundância e de bem-estar internacional. São, simplesmente, puras manifestações das profundas tensões sociais que atravessam o país. A violência que acomete os estádios - e especialmente suas redondezas - não passa de uma pequena dimensão da violência que acomete todo o país. Remete aos mesmos esquemas que produzem anualmente mais de 40 mil cadáveres, produtos de assassinatos de todo tipo, e provavelmente também aos esquemas que produzem número semelhante de corpos nas estradas do país dos campos alegremente baldios. Vou além, e especulo que esteja provavelmente ligada aos fatores estruturais (políticos, sociais, econômicos...) que fornecem o fundamento a partir do qual as espécies de mentalidade tupiniquim agressivas, autoritárias e intolerantes se desenvolvem.

Provavelmente não há princípio de divisão, no Brasil, mais eficaz que o futebol para dividir, classificar e opor indivíduos. Em muitos casos, antes de tudo, o homem médio brasileiro é um partidário de algum clube. E de alguma torcida. O futebol é uma guerra supostamente dissimulada, lutada por outras vias; no Brasil, isso nem sempre é verdade, tornando-se uma guerra de fato. Não há disposição mais anti-democrática que aquilo que comanda as torcidas brasileiras. A influência do futebol já é grande demais. O espírito que o comanda, se feito Estado, mais se assemelharia a um estado de guerra civil constante, numa sociedade dividida por milícias lutando pelo extermínio do partido alheio.

Carlos Alberto Pimenta escreveu um interessante artigo sobre o assunto, intitulado "Violência entre tordicas organizadas de futebol", apresentando argumento semelhante ao meu.

(Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-88392000000200015&script=sci_arttext Acesso em: 30.mai.2009.)

Em terceiro lugar, o raciocínio de Sócrates é análogo a um sistema de mistificações típicas do esquerdismo populista (no qual a proposta de Sócrates se insere, ainda que, até onde se saiba, ele não seja intelectual, mas apenas ingênuo) que virou moda nos últimos tempos: parte de estereótipos e de mistificações das classes dominadas. Tudo o que se assemelha, por seus aspectos mais superficiais, com o "povo", com a "cultura popular" (e seus correlatos e eufemismos de "pobre" e "pobreza") é associado a virtudes altamente rentáveis simbolicamente: "humilde", "solidário", "altruísta", "consciente", "mobilizado", "passional", "inovador"...

Aqui atingimos o ponto principal de nosso raciocínio.

Que se diga desde já: as virtudes associadas ao "Outro" implicam na condição subalterna e mesmo dominada do "Outro". Há uma relação muito próxima entre a conservação das condições sócio-econômicas dos dominados e as virtudes que são associadas a eles.

É preciso perguntar: quem confere as qualidades ao dominado (e seus eufemismos aprazíveis: "outro", "povo", "popular" etc.)? É o próprio dominado? Compartilha com ele das circunstâncias e das condições objetivas nas quais está inserido? Qual o interesse de alguém celebrar aqueles que ocupam uma posição inferior à sua própria?

Temos uma horda de intelectuais e de outros membros das profissões "alternativas", indivíduos das classes médias e altas, que compartilham das premissas de Sócrates. E, assim como Sócrates - ou mais -, lucram quantidades incomensuráveis de capital simbólico com sua "representação popular": como se estivessem descolados do espaço social, os virtuosos das classes superiores virtuosamente transformam-se nos representantes e nos ideólogos dos fracos e dos oprimidos.

A projeção romantizada e idealizada que fazem do "povo" não passa de um constructo puramente abstrato: o "povo" do esquerdismo populista tem corpo de povo, mas cabeça de intelectual.

Esse constructo, essa mistificação, tão corrente nos espaços sociais e simbólicos onde sucede a vida dessa classe muito específica de privilegiados, opera como uma forma bastante perspicaz de produzir e reproduzir capital simbólico. É como se esses indivíduos, por meio das operações de construção daquele mito, se amalgamassem a ele, atribuindo para si todas as características virtuosas que atribuem ao "povo": o esquerdismo populista "se transforma" no "povo"; o representante dos fracos e dos oprimidos se veste como o "povo"; ele tenta viver como o "povo"; tenta falar e pensar como o "povo". E de fato consegue, pois trata-se do povo entre aspas, isto é, a mistificação idealista e virtuosa dos dominados - um processo que, aliás, o dominado está excluído.

Tal alquimia simbólica, evidentemente, só existe e só é eficaz porque ocorre dentro de um espaço social sociologicamente compatível com ela. Sendo auto-referente, fechado em si mesmo, o universo social da esquerda vulgar confere suas recompensas aos seus próprios membros. Os próprios pares são responsáveis por reconhecer as empreitadas individuais de incorporar as propriedades do "povo" - lembramos, do "povo", o povo-intelectual entre aspas, que confere muito mais prestígio, reconhecimento e afirmação ontológica (além de outros derivativos do capital simbólico, como o capital sexual) que o povo real, isto é, as classes dominadas, fadadas a uma vida de sobrevivência que não se assemelha em nada com a aristocrática arte de vida dos ideólogos do "povo".

Associando-se com o "povo", tornando-se o "povo", o intelectual da esquerda vulgar acessa, assim, todo tipo de lucro simbólico. Transforma-se no ser humano mais nobre do mundo, num detentor de todas as virtudes - virtudes que os donos do poder econômico e político, seus inimigos diretos, não possuem.

Pois é lógico que o futebol, este substantivo popular por excelência, cumpra um papel importante na mitologia do esquerdismo vulgar brasileiro, essa espécie de estilo e arte de vida que toma coloração política (e, freqüentemente, científica).

Não precisamos de torcidas mobilizadas ou de políticas sociais futebolísticas. Precisamos daquilo que todos sabem, que compõe o senso comum: instituições democráticas eficazes; fortalecimento das instâncias representativas e do controle social dos legisladores e administradores públicos; políticas que distribuam a riqueza econômica; um forte sistema de ensino público, que distribua universalmente as condições de acesso aos valores mais importantes da sociedade e que valorize o professor e o conhecimento etc.

Precisamos de instituições verdadeiramente racionais e, ao mesmo tempo, democráticas.

Talvez seja precisamente o alto grau de vulgaridade que acomete esses imperativos, o fato de fazerem parte do senso comum, que estimule as frações de classe "alternativas" a buscarem receitas simbólica e socialmente mais rentáveis, ainda que irrealistas e perversas na mesma proporção.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

O Senado, a Sibéria e o cemitério

O Senado, por princípio, é uma casa mais conservadora do que a Câmara dos Deputados. No passado era vitalício, os mandatos terminavam no cemitério, e o Imperador escolhia os sucessores, notáveis mais velhos e mais experientes. Foi concebido como casa revisora, que devia moderar as escolhas supostamente mais progressistas e muito inovadoras da Câmara Baixa. Os Estados Unidos deu-lhe nova função institucional, de representar as unidades federativas, para garantir que os estados tivessem seus interesses defendidos no sistema político. À “câmara dos comuns” cabe representar o “povo” do país inteiro e manifestar os sopros reformadores advindos das ruas.

Tais inovações, ao lado de outras (tais como a existência de mandatos eletivos e finitos), não retira o caráter conservador do Senado. No Brasil, um mandato de 8 anos e a idade mínima de 35 anos atestam que a casa ainda se destina aos políticos “mais experientes”, dotados da moderação necessária para o exercício de revisar e equilibrar as decisões da Câmara Baixa. Além disto, trata-se de um local mais pomposo, com muito menos cadeiras, sessões silenciosas, gabinetes suntuosos, de tal modo que a relação entre cada um dos seus membros seja tão importante (ou talvez até mais) do que a relação entre os partidos, as bancadas ou os grupos parlamentares de qualquer natureza.

Não é casual, portanto, que as decisões do Senado dependam muito mais de jantares entre 4 ou 5 senadores (como foi na derrubada da Medida Provisória que criava a Secretaria de Planejamento de Longo Prazo) do que de lutas políticas acirradas.

Igualmente, arrolar sucessivas investigações internas, o silêncio e a baixa ressonância das manifestações da opinião pública atestam que este não é um lócus de disputa por decisões substantivas. É, antes disto, um local destinado a abrigar caciques políticos cansados da rinha parlamentar, à espera de uma eleição para o governo do seu estado, ou para um assento num ministério coadjuvante, ou simplesmente para ter as benesses materiais e simbólicas advindas de um cargo virtualmente importante.

Também não é casual que já no fim do século XIX Machado de Assis apontasse o Senado como um lugar fadado a ser sempre a antiga Sibéria. Só que foi justamente a calmaria e o pitoresco que conferiram à Sibéria o seu significado histórico, assim como ao Senado cabe a radicalização das conveniências políticas. Os senadores querem paz, querem uma morte política lenta e suave. Como os governadores, os deputados federais e a classe política como um todo também o quer, dificilmente o Senado deixará de existir apenas pela fraqueza do “bicameralismo”.

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Quem não legisla...

O Supremo Tribunal Federal irá, nesta quarta-feira (03/10), votar o Mandado de Segurança impetrado pelo Democratas, PSDB e PPS, em que o principal ponto a ser dfiscutido será: o mandato pertence ao partido político ou ao político?

Se o Plenário do STF decidir a favor dos partidos, (os analistas estão quase certos que acontecerá) estará implantada no Brasil a fidelidade partidária de inopino e a revelia de todos os processos democráticos instituidos. Isso revelaria, assim como em outras decisões que vêm sendo tomadas por esse tribunal, a ganância legiferante do Poder Judiciário. Se assim entender, ficaria prejudicado todo o sistema de repartições de funções instituido pela Constituição da República de 88, sem falar no golpe fatal que receberá o Congresso Nacional, desmoralizado e já sem função.

Quem perde somos nós e principalmente aquela velha dama, já antiquada nestes tempos pós-modernos: a democracia.

sábado, 29 de setembro de 2007

GOVERNOS DE COALIZÃO OU FARRA DO BOI?

Nos últimos dias temos visto o PMDB dar um baile no governo para conseguir mais cargos na administração federal. A tática é simples, bloquear ou dificultar as propostas enviadas pelo governo ao congresso (pobre Mangabeira, que ficou sem pasta). Os acontecimentos dos últimos dias suscitam a discussão de como funcionam os governos de coalizão, no geral, e como esses são operados no Brasil.

A barganha por cargos existe em todas as democracias do mundo, faz parte, portanto, do jogo para formar maiorias. Não podemos nos esquecer que partidos existem para chegar ao poder (se as organizações não podem detê-lo totalmente, o partilham), e a materialização dessa função são as ocupações de cargos.

O problema é que no Brasil o troca-troca foge completamente da normalidade. A falta de uma burocracia efetiva, e a conseqüente existência de um absurdo de cargos que são preenchidos por indicação, tem como efeito deletério um funcionamento puramente fisiológico da coalizão. A opção por um funcionalismo de “confiança” e não de “carreira”, está na essência da formação das maiorias no país, pois, participar do governo, ocupando ministérios, secretarias e estatais torna-se interessante justamente pela possibilidade de através desses órgãos serem montadas redes clientelísticas, que vão beneficiar partidos, parlamentares e suas bases (prefeitos, vereadores e etc.).

Soma-se a esse fato a inexistência de um controle parlamentar do ministério. Como não há uma construção minimamente programática da coalizão, o gabinete não está comprometido com uma agenda de propostas a serem implementadas. Sendo assim, o ministério é desfeito por várias razões, que vão desde a eleição para as presidências da Câmara e do Senado, que dão nova configuração ao poder de barganha no Congresso, passando por reveses do partido do presidente e suas alianças nas eleições municipais, pois, se o chefe do executivo federal e sua organização não forem bons cabos eleitorais, os aliados venderão mais caro seu apoio no legislativo, chegando até crises políticas e a própria vontade do presidente. Nos regimes parlamentaristas e semi-presidencialistas, onde o gabinete emerge do parlamento, sendo condição para ocupar uma pasta ter sido eleito para o legislativo, se a coalizão não consegue executar um eixo mínimo de propostas, que amarraram dois ou mais partidos e possibilitaram a formação de uma maioria, o ministério pode ser desfeito e serem convocadas novas eleições para o parlamento. Obviamente que esses sistemas também são vulneráveis ao fisiologismo e a conveniências eleitorais, contudo, a possibilidade de dissolver o gabinete e o legislativo limita o troca-troca ministerial, e proporciona algum tipo de controle sobre o desempenho da coalizão em aprovar e executar políticas públicas.

As coalizões funcionam no Brasil, o problema é como e a que custo. A falta de uma burocracia efetiva e de um controle sobre o ministério transformou a formação de maiorias no Congresso numa farra do boi. As conveniências políticas sempre existirão, entretanto, a inexistência de um conjunto de propostas e metas, que permeassem todo o ministério e a maioria que lhe dá sustentação, de um funcionalismo de carreira, que não estivesse preso aos cargos pelos finos laços da indicação, e da possibilidade de dissolver a coalizão, caso essa não estivesse exercendo com eficiência suas funções, não empresta nenhum caráter programático aos governos multipartidários brasileiros, sendo esses formados apenas com base nas vantagens eleitorais e políticas que os partidos podem ter ao ocupar determinados cargos.

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Pesquisa - Confiança Institucional

A Associação Nacional dos Magistrados publicou ontem em seu sítio uma pesquisa realizada entre os dias 4 a 20 de agosto, sobre o nível de confiança dos brasileiros nas instituições públicas brasileiras. Para a classe política, a pesquisa foi reveladora: 83,1% não confiam na Câmara dos Deputados, 80,7% não confiam no Senado Federal, 89,3% não confiam nos partidos políticos e 81,9% não acreditam nos políticos. Nada de novo conforme pesquisas realizadas pela Latino Barómetro.

Note-se, que apesar dos escândalos no Senado Federal, ele obteve porcentagem de confiança maior que a Câmara Baixa. Isso permite inferir que, por mais que a mídia influencie de sobremaneira a imagem das instituições, a população consegue, a partir de fontes de informações diversas, formar uma opinião própria, em menor ou maior grau.

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

Foi aprovado na Câmara Federal a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. Em nota veiculada no jornal Folha de São Paulo, diz-se que o fundo foi criado para regulamentar e permitir a transversalidade entre as áreas. Pelo visto as Ciências Sociais não foram deixadas de fora. É mais um passo para que a profissionalização dos cientistas sociais avance.

Disponível para assinantes em: www.uol.com.br/fsp

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

O caráter público da política

artigo publicado na Gazeta do Povo em 6 set. 2007

Adriano Codato

Proposições normativas devem se apoiar em conhecimentos objetivos. Ou melhor: quando dizemos como as coisas devem ser, devemos antes saber como as coisas são, e porque não gostaríamos que elas fossem assim. Esse preceito, que vale em muitas áreas, para ser econômico, deveria valer mais ainda quando se discute alternativas políticas.

No “debate” recente sobre a reforma do sistema eleitoral ouviu-se muito sobre as vantagens, supostas, do voto distrital sobre o voto proporcional (para ficarmos só nesse exemplo) sem que se demonstrasse de fato quais as implicações reais na mudança de um regime de votação para outro. A representação da bancada do Paraná na Câmara Federal conta com 30 deputados, eleitos por diferentes regiões e graças a um número específico de votos, conforme o partido político a que pertencem. Caso mudasse o sistema, como ficaria? Melhor? Pior? Melhor ou pior para quem? Para os próprios políticos (pois diminuiria a competição) ou para os eleitores (pois aumentaria a fiscalização)?

O caso do “debate” sobre o financiamento público das campanhas dos políticos é ainda mais curioso. Além de não sabermos quanto custa uma campanha, já que as declarações de contas nos tribunais eleitorais são, digamos, imprecisas, em função dos recursos “não contabilizados”, não sabemos também exatamente quanto, uma vez introduzido o novo esquema, elas custariam. Não sabemos inclusive se seria conveniente que elas fossem custeadas pelo Tesouro. O “argumento” segundo o qual na Alemanha é assim, e lá dá certo, parece, digamos também, incerto.

A polêmica sobre o voto aberto ou voto secreto nas casas legislativas é um bom exemplo daquilo que já sabemos e daquilo que não sabemos ainda.

Há argumentos sensatos para sustentar que, em determinadas votações, o parlamentar possa votar anonimamente. Vejamos quatro dessas razões.

O voto secreto garantiria ao deputado, ou ao vereador, liberdade para escolher entre a decisão A ou a decisão B já que ele estaria livre de pressões indevidas – do presidente, do governador, do prefeito, do presidente da mesa, do líder do partido ou de algum manda-chuva, que há muitos. O representante poderia assim votar conforme sua consciência. Esses motivos alegados são, para quem defende a idéia, não apenas lógicos, mas derivados de um princípio jurídico incontestável: o direito que todos nós eleitores temos ao voto secreto.

Por outro lado, pode-se opor a essas razões, razões tão boas quanto, e em sentido contrário.

O voto secreto do representante político não é um direito. É uma convenção estabelecida pelo regimento interno da Casa (Câmaras, Assembléias), já que se trata apenas de um mecanismo deliberativo. Garanti-lo ou aboli-lo é uma questão que escolha entre dois modelos políticos, não entre um direito e uma ofensa a ele.

Isso é assim (ou deveria ser assim) porque a liberdade fundamental não é a do representante, mas a do representado. O representante, que é em nosso sistema político bastante livre, pois só presta contas em momentos eleitorais, quando presta, é (ou deveria ser) um procurador, não um intermediário. Sendo assim, os eleitores precisam saber que escolhas foram feitas, pois só essa informação permite, de fato, pressão sobre o “seu” deputado. Em vista disso, a pressão (ou chantagem) de políticos mais poderosos é menos importante do que deveria ser o constrangimento de votar contra a opinião dominante – mesmo porque pressões e contrapressões dos políticos fazem parte da regra do jogo que eles mesmos estipularam.

Caso fique garantido o “direito” de votar contra a orientação do partido, seria o caso de perguntar: para que então servem os partidos? Partidos funcionam, na arena eleitoral e na arena parlamentar, para sinalizar opções políticas diferentes. Se essas posições fossem intercambiáveis e o político de centro-esquerda pudesse votar, graças à sua “liberdade”, como o político de centro-direita, e vice-versa, o jogo político se tornaria imprevisível, o que aumentaria o custo das negociações. Em duas palavras: mais tempo (para construir acordos) e mais dinheiro (para chancelar esses acordos).

O direito fundamental de votar conforme crenças subjetivas só seria válido se a política efetiva pudesse ser convertida numa negociação entre a consciência do representante e grandes questões abstratas, ou dilemas morais. Ora, o representante, procurador ou delegado não se defronta com questões de princípio, mas com questões concretas. Nesse sentido, toda moralidade é política, ou melhor: todos os casos que envolvam aspectos morais e que digam respeito à conduta dos políticos, são questões políticas. E toda política é (deveria ser) pública, por definição.

Conhecendo ou estimando os efeitos possíveis do voto secreto e do voto aberto, fica difícil discordar da divisa proposta pelo juiz da Suprema Corte dos EUA, Hugo Black (1886-1971): “a luz do sol é o melhor detergente”. Sempre.

Adriano Codato é professor de Ciência Política na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e coordenador do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira

sexta-feira, 31 de agosto de 2007

[Opinião] Turquia, Brasil e Forças Armadas

A Turquia é um dos únicos países, senão o único, que, apesar de apresentar a população majoritariamente muçulmana (99% da população, maioria sunita)*, adotou o regime democrático como forma de eleger seus representantes. Seu sistema de governo é o parlamentarismo e tem como chefe de governo o primeiro-ministro, e seu chefe de Estado, o presidente, com mandato de 7 anos, que é eleito pela Grande Assembléia Nacional.

O país passou recentemente por um teste de estabilidade e solidez de suas instituições democráticas. O premiê Recep Erdogan, em abril, tentou emplacar para a presidência o ex-chanceler Abdullah Gül, ambos filiados ao partido muçulmano moderado AK, uma versão que se aproxima dos partidos democráticos cristãos europeus. As forças castrenses e o alto funcionalismo público do país, pretendendo evitar que os ganhos obtidos com o Estado laico (como por exemplo, a proibição do véu islâmico muçulmano “hijab” em instituições públicas) fossem perdidos, ameaçaram um coup d’État. Erdogan antecipou as eleições parlamentares para julho e com o respaldo popular (47% dos votos) acabou por aprovar o nome do ex-chanceler para a chefia do Estado. Os militares, apesar de não aprovarem, silenciaram.

Aqui também passamos por uma sabatina das instituições democráticas, não muito tempo atrás. Os escândalos de corrupção deflagrados no final do primeiro mandato do presidente Lula (2005) ensejaram alguns rumores sobre o possível golpe das Forças Armadas. Contudo, o funcionamento normal e eficiente das engrenagens democráticas (Ministério Público, Poder Judiciário, Comissões Parlamentares de Inquérito) afastou as possibilidades de intervenção castrense direta. É o que retira do julgamento de parlamentares e pessoas ligadas ao esquema de corrupção pela Suprema Corte.

Contudo, não está afastado as possibilidades de intervenção das 3 Armas fora da caserna. É sabido que durante todos os governos democráticos desde a Constituição da República de 1988, de Collor à Lula, houve uma série de interferências localizadas por parte dos militares, resultando, por vezes em recuos e avanços nas relações civis-militares.

Concluí-se, que como a Turquia (claro que de formas e maneiras diferentes e em grau muito menor), o Brasil ainda está engatinhando na relação do Estado Civil livre de intervenções do Poder Castrense. Ainda mais quando nossa Constituição Democrática trata das Forças Armadas no Título V “Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas”, no Capítulo II, legando às 3 Armas a defesa dos poderes constitucionais, da lei e da ordem.

* Dados retirados da Enciclopédia Online Wikipedia.

Aécio Neves e a Paulicéia Desvairada

Em entrevista ao Jornal Folha de São Paulo, no dia 27 desse mês, segunda-feira, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, mostrou que está na balada certa para ser candidato a presidente da república, seja pelo PSDB, seja por outro partido. Apesar de ter dito que não cogita ser candidato por outra legenda, e que estará do mesmo lado de Serra em 2010. Entretanto, alguns motivos me fazem crer que essas afirmações podem mudar ao longo do tempo.

O primeiro é que Aécio dialoga com partidos que não fazem parte do histórico de alianças do tucanato. Ao conversar com o PSB, PDT e PPS, parece querer formar uma base que lhe propicie pressionar por fora seu partido, sem depender de outros aliados externos e mais tradicionais, como o DEM, próximo umbilicalmente de Serra. Essa base ainda poder servir de válvula de escape caso ele perca a indicação, pois terá uma frente pronta para candidatar-se. Mostrar a capacidade de se contrapor a qualquer antagonista dentro de seu partido, sem depender de companheiros certos e do próprio PSDB, parece ser a estratégia do governador.

Além disso, Aécio tem um bom diálogo com o PT e evita críticas ácidas ao presidente Lula, pois caso a popularidade do petista continue nas alturas ele poderá fugir do rótulo de anti-Lula, que é muita mais a cara de Serra. Ainda, isso lhe dá legitimidade para disputar a base de sustentação ao atual governo e ampliar seu leque de alianças.

O mineiro ao fazer elogios à política social do governo federal e ao mesmo tempo defender a necessidade de reformas estruturais, tenta conjugar aquilo que nenhuma liderança política do país, ainda mais as que pertencem à organização tucana, tem conseguido fazer, ou seja, aliar a agenda de distribuição de renda com a de desenvolvimento econômico (que nunca foram excludentes, antes são complementares). É impossível numa nação pobre como a nossa que um partido, que pretenda ter sucesso eleitoral, não tenha um projeto social amplo e claro. Aécio parece dar demonstrações bem definidas que pretende superar os tecnicismos tão típicos das jornadas tucanas e apresentar bandeiras eleitoralmente viáveis. Pois convenhamos, choque de gestão não é mote de campanha, ajuste fiscal não é modelo de desenvolvimento e o Plano Real já está batido. Portanto o governador faz muitas das coisas que o PSDB deveria fazer para sair da encruzilhada em que está, superar os muros de classe média que construiu em torno de si e tornar-se uma alternativa política que vá além da impossibilidade de Lula ser candidato.

Toda essa movimentação do governador parece demonstrar que ele tem consciência do óbvio. O PSDB é um partido de paulistas. Caso não sejam realizadas prévias, onde a base da legenda decidirá quem será o presidenciável, será muito difícil Aécio conseguir a vaga. Serra não quis realizar eleições internas em 2002, e dado o evidente controle do estado que governa sobre o partido, não deverá aceitar tal procedimento para 2010.

Enfim se a paulicéia desvairada que controla a legenda não renovar as idéias (mergulhar de corpo e alma na questão social e pelo menos dar uma nova roupagem ao ideário neoliberal), não buscar novas alianças (com partidos de centro-esquerda) e não adotar procedimentos minimamente democráticos internamente (prévias e congressos), poderá levar o partido a mais um derrota eleitoral nas presidenciais e relegar o PSDB a insignificância. Aécio Neves sendo uma força que independe do partido, não tem absolutamente nada a ver com isso.

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

[Notas] A Cabeça da Elite na bandeja

Bruno Bolognesi
CANSEI dos ovos da elite.
CANSEI de empregada doméstica espancada.
CANSEI de índio queimado vivo.
CANSEI de briga de pit boy em Ipanema.
CANSEI de lutador de jiu jitsu espancando trabalhador.
CANSEI de granadas para roubar casas.
CANSEI de filhas matando os pais á pauladas na calada da noite.
Viva o lado bom do Brasil - a ELITE - segundo a revista VEJA de 22 de agosto de 2007.

sábado, 25 de agosto de 2007

Os políticos e sua classe

por ADRIANO CODATO, professor de Ciência Política na Universidade Federal do Paraná

(publicado na Gazeta do Povo, 24 ago. 2007)

A discussão sobre o nepotismo, o favoritismo e outros “ismos” de má-fama não deveria estar desligada do debate em torno da extensão do foro privilegiado às autoridades do Legislativo, aprovada pela Assembléia de Minas Gerais. Nem da reação “corporativa” dos senadores diante do caso da contabilidade pessoal de Renan Calheiros (PMDB-AL).

Os dois primeiros fatos são a extensão lógica de um fenômeno maior e que o terceiro caso representa de maneira espetacular: o fechamento do universo político sobre si próprio.

Quais as funções dos reapresentantes políticos? Não é preciso ser filólogo para descobrir: representar interesses sociais. Os políticos são profissionais que representam outros na impossibilidade prática desses outros fazerem isso por si mesmos.

O sociólogo alemão Max Weber sugeriu que haveria assim dois tipos de políticos profissionais: aqueles que vivem da política (como um meio de vida) e aqueles que vivem para a política (como um modo de vida). Só nesse segundo caso a política seria uma vocação verdadeira, e não um tipo de emprego como qualquer outro.

Contudo, o que se observa, nas democracias representativas, é que só vive para a política aquele que vive da política. Entre nós, os políticos até representam grupos sociais, mas só fazem isso à medida em que representam, em primeiro lugar, a si próprios.

O peculiar é que, num universo político cada vez mais autônomo, as relações entre os políticos tornam-se mais importantes do que as relações dos políticos com a sociedade. Na ausência de qualquer controle social, eles podem então se imaginar “donos” do poder para dispor dos empregos públicos à vontade ou para serem julgados só em tribunais especiais.

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

[Opinião] Adesão Normativa e Renan Calheiros

O Presidente do Senado Federal, Renan Calheiros, está cada vez mais atolado na areia movediça de denúncias que cercam sua vida financeira. Pagamento de pensão por intermédio de lobbystas, compra de transmissora de rádio por interposta pessoa, patrimônio incompatível com sua renda, só para ficar nas principais.

A opinião pública, formada que é por mídias de inclinação política no mínimo duvidosa, compra sem pestanejar as acusações, sem se perguntar ou pensar nas suas situações do cotidianas.

Agora, saiamos de Brasilia, e venhamos para o palco da vida como ela é: pagamentos por interpostas pessoas, recebimento de montantes de dinheiro duvidosos, fraude e evasão fiscal, declaração de patrinômio incompatível com vencimentos, compra e venda de recibos, venda de vale-transporte, furtos de pequeno valor, suborno de guardas e autoridades de trânsito, descaminho (entrar no país sem pagar o tributo devido) de produtos vindos do estrageiro, crimes contra a Lei de Direitos Autorais, pirataria, declarações de venda de imóveis com fins de fraudar o fisco e fraudes de todos os tipos. Todos nós somos criminosos, então.

A adesão normativa, ou seja, a incorporação das regras e normas jurídicas e até mesmo de regras morais no comportamento dos cidadãos brasileiros é muito baixa, fazendo com que se utilizem do jeitinho para burlar todos os tipos de regras. Para tudo pode ser dado um jeitinho.

Não por isso sou contra a punição quando do cometimento do crime: também sou a favor da repressão. Só penso que se todos os delitos fossem punidos ficaríamos sem prisões. Mas, como sempre, Barrabás livrar-se-á solto.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Baixa presença feminina na política

A 2a. Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, realizada desde o dia 17 corrente em Brasília, discutiu amplamente a (baixa) presença das mulheres nos "espaços de poder".

De acordo com a notícia publicada no site da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), órgão ligado ao gabinete da Presidência da República, o Brasil é um país que está muito aquém de boa parte dos parlamentos do mundo, ocuapando a 107a. posição (de um total de 189 países) no que diz respeito à presença de mulheres com cadeiras nos parlamentos. Quando se olha exclusivamente para a América do Sul, o Brasil está na útlima colocação.

A lei de cotas, em vigor no Brasil desde 1997, deveria assegurar que 30% das candidaturas dos partidos fossem destinadas a candidatas mulheres. A lei não foi respeitada por praticamente nenhum partido político e, portanto, não surtiu efeitos para aumentar a presença das mulheres nos parlamentos brasileiros (em nível nacional e sub-nacional).

Uma pesquisa Inter-Parliamentary Union atesta esse quadro de uma minoria feminina nos parlamentos brasileiros: as mulheres ocupam menos de 9% na Câmara dos Deputados e 12% no Senado Federal. No âmbito estadual e municipal a situação se repete com apenas 11,2% de mulheres nas assembléias legislativas e 12,6% nas Câmaras de Vereadores.

As intervenções da conferência avaliaram que as mulheres já têm uma presença acentuada nos movimentos sociais e sindicais e que esbarram na falta de oportunidades dentro dos partidos políticos. Isto indica que as estruturas dos partidos devem ser alteradas, mediante uma penalização pelo descumprimento da legislação em vigor, bem como uma maior cobrança da sociedade civil, intensificando a imposição desta agenda, assim como se deu em casos como o da Argentina na década de 90.

Um dado interessante para ilustrar este diagnóstico encontra-se no gráfico abaixo:

Organizado pelo Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira-UFPR

O caso do estado do Paraná demonstra que, de fato, a baixíssima presença de mulheres-candidatas é uma barreira para que se incremente a participação feminina nos postos formais de mando. Desse modo, indica que o recrutamento partidário deve servir como um dos parâmetros-chave para aumentar a inserção feminina nos cargos de direção política. Há que se respeitar e aperfeiçoar, portanto, a legislação eleitoral e partidária.

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Charge do Angeli, na Folha de S. Paulo de hoje


A foto que abre a página do movimento Cansei parece uma comoção na Ilha de Caras; ou talvez uma campanha pela prevenção do câncer de mama?

[Opinião] Cansei mesmo...

Ato do 'Cansei' frustra parentes de vítimas do Airbus

O movimento Cansei promoveu seu grande ato hoje (4000 pessoas, em São Paulo).
Entretanto, nesse ato, até mesmo as pessoas que foram as diretamente atingidas pela falta de infra-estrutura aeroportuária, parentes das vítimas do acidente aéreo, não tiveram espaço para manifestação. Mais uma demonstração do quanto estão engajados e preocupados com direitos dos cidadãos. Defendem, em última análise, seus próprios interesses (a "elite branca", à Cláudio Lembo).

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

[Opinião] Razão e Sensibilidade

Uma nova crise econômica parece se avizinhar. Os principais bancos centrais do mundo, o europeu, o americano e o japonês, estão queimando reservas para acalmar esse ente muito sensível, o mercado (parece que ele anda como uma pessoa entre nós e temos que tomar muito cuidado para não magoa-lo). No Brasil, Meirelles, Mantega e Lula dizem que a crise não vai atingir o Brasil. Será? Estou torcendo para que não (mas literalmente não apostaria meu dinheiro nisso).
O problema é que se realmente a crise emplacar as chances de retomar o crescimento podem ir por água abaixo. Um trem de oportunidades está passando na frente de Lula, bem devagar, mas bem devagar, e não há Cristo que faça ele embarcar. Os juros parecem que vão voltar a crescer (o processo de corte da taxa básica, a selic, estava barateando a dívida, o que deu 60 bilhões ao governo para gastar), o dólar que estava em 1,85 já está em 2 reais. A bolsa que penou para passar dos 50 mil pontos (estava chegando aos 60), parece que vai voltar para abaixo desse índice. Será o início do fim da pujança?
Acontece que o governo não apostou num modelo de crescimento diferente, investindo numa estrutura que já não consegue mais fazer a economia se desenvolver a muito tempo, esse estado, que conjuga estrutura de social democracia européia com políticas fiscais ortodoxas (ou neoliberais?). Lula embarcou na popularidade e na boa fase da economia mundial para manter as coisas como estavam. Por um lado manteve a ferro e fogo a política econômica do antecessor, o que minguou as pretensões de setores do seu partido e os recursos para investimentos. Os superávits continuaram altos, os juros na estratosfera e o crescimento quase subterrâneo. O governo não chegou nem perto de discutir uma maior intervenção estatal em setores estratégicos, como os de minério e energético e muito menos políticas protecionistas (ao contrário, num ato que só o governo entendeu, considerou a China como economia de mercado). Por outro lado, não aprovou as ditas reformas estruturais, não criando um ambiente tido como propício para investimentos, com carga tributária menor, procedimentos burocráticos mais limpos e uma legislação trabalhista flexível (essa última, com razão, causa arrepios na base tradicional do PT). Nem à esquerda, nem à direita. Nem desenvolvimentismo, nem neoliberalismo. Apenas manteve, se não piorou, o deformado Estado Brasileiro.
O Brasil poderia ter crescido muito mais. Atingimos índices inexpressivos perante outros países em desenvolvimento, mesmo tendo incontáveis potencialidades (não cansa repetir isso que está todo mundo cansado de ouvir, mas quem sabe um dia entra por osmose). Na falta de sensibilidade do atual governo, continuará imperando a razão dos burocratas da economia. Só nos resta torcer para crise não vir, e para que o passageiro Lula, finalmente embarque.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

[Opinião] OAB e sociedade civil

* Bruno Bolognesi

AO LER O JORNAL Folha de São Paulo da data de hoje não me surpreendi mais. O dito folhetim citou ao menos três vezes a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em suas notas e reportagens. O jornal efetivamente não parece ter "culpa" por este fato, mas o que causa estranhamento é o envolvimento que a OAB tem tido em questões de governo, soberania nacional, relações internacionais, movimentos "populares", movimentos "burgueses", etc, etc, etc.
Tal fato me salta aos olhos por um único e simples motivo: será a OAB representante de alguma outra coisa senão da própria classe que a compõe? O termo classe aqui é aplicado em dois sentidos (para o óbvio marxiano): classe profissional, ou seja, os senhores advogados e; elite, seja ela política ou econômica, afinal estamos no país dos bacharéis e desconheço advogados paupérrimos.
Sinto que a citada ordem tem se travestido com a máscara da classe média - vide movimento CANSEI, encabeçado pela OAB/SP - defendendo interesses que mais parecem uma música carnavalesca (sabe aquela marchina?... "ei você aí... me dá um...", pois então.) Para além de tais movimentos observo que não só a pequena burguesia pensante dá crédito mais do que suficiente para nossos advogados, o Estado também o faz. Por inúmeras vezes senadores, deputados, ministros e até mesmo o presidente da República consultaram a OAB para pareceres de projetos, leis, emendas, opiniões e pitacos em geral. Que seja ressentimento, mas não acredito que a instituição que chancela a advocacia no Brasil esteja apta para, sozinha, avaliar políticas públicas, questões internacionais, "puxar" movimentos e ainda ter que cuidar do próprio rabo.
Pergunto então se existe mais alguma "instituição" que esteja disposta em estabelecer diálogos com o Estado e com o Governo. Creio que elas existam, mas acredito que o Governo e seus ocupantes não estejam aptos a enxergá-las. Talvez com um leque maior de instituições representativas em constante diálogo com o Governo, a sociedade civil sentir-se-ia mais representada.
Pode se legitimar essa "influência" de quatro modos: normatização, ou seja, reconhecer entidades representativas para diálogos e consulta; tradição, ou seja, por um processo histórico que faça parecer legítima a atuação da instituição para tal "serviço"; competência, buscando identificar os õrgãos e instituições mais qualificadas para opinar sobre determinado tema e; "jogo de interesses", quando os interesses de Estado e de Governo se encaixam de forma sobreposta com os interesses da instituição, tonando-a legítima para o Estado, mas nem sempre para a sociedade civil. Acredito que a Ordem dos Advogados do Brasil se encaixa apenas no segundo e último ponto.
OU, ledo engano meu. Talvez a OAB queira mesmo ajudar a nação.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

[Opinião] Diferenças entre PSDB e PT

Segundo a professora Lourdes Sola, cientista política da USP, "o PSDB tem um pudor enorme de se apropriar de suas realizações políticas e um medo pânico de ser acusado de direita".
A afirmação encontra-se em entrevista publicada pelo jornal O Estado de São Paulo de ontem (de 12-08-07, disponível aqui), que acompanha uma matéria sobre o congresso do partido, convocado para setembro, que promete ser uma "cruzada" para enfrentar os fracassos das últimas eleições e a falta de "identidade" do partido junto ao eleitorado.
A entrevista é esclarecedora dos erros e desafios do PSDB, por um lado, e de algumas diferenças entre os governos tucano e petista, por outro.
Entretanto, duas avaliações da professora me parecem equivocadas:
1) Creditar a "blindada" popularidade de Lula ao bom momento da economia e aos programas assistencialistas está se tornando um lugar comum cansativo em qualquer lugar que se olhe na imprensa. Estabilidade econômica é garantia de altas taxas de aprovação para qualquer governo, mas as taxas de Lula surpreendem. Ao ponto de fazer valer a máxima: precisamos de mais dados e de mais tempo para entender o fenômeno. É preciso mais tempo para sentir os efeitos de tamanha popularidade na competição política e é preciso uma maior profundidade de dados (do que simples pesquias de popularidade) para desvendar suas causas. Então, não parece suficiente afirmar que Lula está com a avaliação positiva apenas por tais razões, e nem mesmo convence afirmar que "o preço dos alimentos e do cimento também baixou" para complementar o argumento. A contar pela última pesquisa do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), o preço dos alimentos voltou a subir além da média de inflação do semestre e não deverá afetar as taxas de aprovação de Lula.
2) Parece que a diferença básica entre o PSDB e o PT não reside em sua posição com relação às instituições; nem mesmo aquilo que seus programas defendem deve ser o elemento central. O que parece ser a diferença central é a origem de cada um. O PSDB nasceu de uma cisão do PMDB no interior do Congresso, no final da década de 1980. Foi formado por uma facção parlamentar descontente do PMDB, com nomes consolidados da política nacional, chegando ao poder em diversas prefeituras e estados importantes, culminando com a eleição de Fernando Henrique Cardoso para a presidência em 1994. O PT, por sua vez, é um partido com origem no sindicalismo operário paulista, nos movimentos católicos de base e em setores intelectuais, que nasce com uma proposta política revolucionária e apresenta uma estrutura interna muito original, mesmo em relação aos casos típicos da social-democracia européia. Apresentou um mobilização crescente, uma militância intensa e um crescimento eleitoral lento e consistente. Agora que ambos se tornaram os principais atores da disputa política no Brasil, esquecer essas histórias e olhar apenas para os programas (que são mais mutáveis do que a própria história de cada um) é desconsiderar aquilo que é sociologicamente mais decisivo: as relações entre os militantes e o seu partido que cada tipo de formação partidária ensejou. O PT mudou o programa, se adequou à receita neoliberal e hoje enriquece os banqueiros, se aproximando do PSDB. Mas não parece que de diferente entre os dois só sobrou apenas a posição de cada um em relação à democracia ou ao "Estado de direito"...

domingo, 5 de agosto de 2007

[Opinião] Taxa de Aprovação de Lula

Foi publicada hoje (05/08/07) na Folha de São Paulo, matéria entitulada "Lula mantém aprovação após caos aéreo e acidente da TAM", de lavra de Fernando Canzian (disponível somente para assinantes). A matéria traz alguns dados que nos ajudam a pensar o tema do meu último post: a questão das prioridades.
A pesquisa nacional realizada entre os dias 1 e 2 de agosto pelo instituto Datafolha, revela que a popularidade de Lula continua intacta, na casa de 48%. A taxa de ruim/péssimo oscilou entre 14% e 15% (não sendo nem perto dos 17% em outubro do ano passado). Inserindo-se um filtro de acordo com a renda, a popularidade do presidente despencou 7 pontos percentuais entre os que contam com a renda familiar acima de 10 salários minimos e, entre os ganham até 5 salários, ela subiu 2%. Aquele decréscimo nada representa, haja vista que apenas incríveis 7,5% da população brasileira faça parte do primeiro grupo.
São suscitadas algumas explicações que, em tese, dariam conta de explicar o fenômeno: apenas 8% da população brasileira viaja de avião; grande parte dos cidadãos brasileiros são pobres, 59,5% (renda familiar de até 3 salários mínimos - R$ 1.050, 00); a situação macroeconômica continua relativamente estável e o Bolsa Família atende 11,1 milhões de pessoas.
São válidas e necessárias algumas das reivindicações da chamada "elite branca", pois estas reformas têm impacto direto na estabilidade macro e micro econonômica do país, que em última análise sustenta o emprego e a renda das famílias brasileiras. Agora, o que não se pode confundir são as necessidades primeiras ou emergenciais, como educação, saúde, fossa sanitária, água encanada e luz elétrica. Depois podemos pensar nos aeroportos, que beneficiam os colossais 8% da população.

Lucas Castro é graduando em Ciências Sociais pela UFPR, membro do GAC/NUSP.

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

[Opinião] Reforma Política e corrupção, uma visão alternativa

Reproduzo parte de um texto de Samuel Pessoa, economista da Fundação Getúlio Vargas, sobre a Reforma Política e a corrupção. É uma opinião alternativa que tem sido muito pouco abordada.

Escreve Samuel Pessoa:

"Em um primeiro momento sinto-me como as pessoas do grupo dos panglossianos. Acho, de fato, que nosso sistema político funciona melhor do que imaginamos e tenho muito receito que ao tentar melhorar o sistema acabemos reformando em direções ruins.

Um dos maiores problemas que vejo é que várias pessoas desejam ou defendem uma reforma política com a finalidade de reduzir a corrupção. Parece-me que se há um problema é melhor atacar a fonte principal do problema. A fonte primária da corrupção não é nosso sistema político mas sim nosso sistema jurídico. Há duas características que reduzem a praticamente zero a possibilidade de um corrupto ser punido. Primeiro, há uma quantidade imensa de recursos e, adicionalmente, o escopo do recurso é total (isto é, qualquer ato processual pode ser objeto de recurso). Segundo, a enorme complexidade processual faz com que seja quase impossível existir um processo sem que haja algum erro processual de sorte que as pendências acabam inválidas antes que elas sejam julgadas no mérito. Finalmente, é possível que haja um terceiro fator, que é a inexistência, pelo menos na prática, do princípio da razoabilidade da evidência (ou da prova). Isto é, quando se acumula um conjunto suficientemente grande de evidência numa direção inverte-se o ônus da prova. Esse deveria ser o princípio ao menos no processo civil (nos EUA esse princípio é aplicado mesmo em processo penal). No entanto, a impressão que tenho é que essa inversão de ônus da prova que ocorre em outros sistemas jurídicos em função do princípio da razoabilidade da prova (beyond any reasonable doubt) é encarada pelos juristas brasileiros como um atentado ao princípio de presunção da inocência. Se não mexermos nesses aspectos do funcionamento do nosso código de processos acredito ser muito difícil reduzir a corrupção com a reforma política.

Dessa forma, se acredito que redução da corrupção depende essencialmente da reforma do judiciário, para quê reforma política? Evidentemente para reduzir a fragmentação do legislativo de sorte a produzir maiorias mais estáveis. Em segundo lugar reduzir o custo da política. Gostaria de atingir ambos os objetivos mexendo o mínimo no sistema atual de sorte a manter suas virtudes. Quando se trata de mudança institucional sou muito conservador. Penso que em geral quando avaliamos custos e benefícios de uma nova instituição somos tentados a superestimar os benefícios da alternativa (e subestimar os custos) e a subestimar os benefícios do status quo (e a superestimar os custos). Dessa forma penso que o processo de evolução institucional deve ser incremental."

Retirado do Simon's Blog, onde pode-se ler o texto na íntegra.

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

[Opinião] Lei Rouanet - PIADA PRONTA

Bruno Bolognesi*
Lendo o último artigo publicado pelo colega Lucas Castro e o comentário postado pelo também colega Luiz Domingos Costa, me ficou na mente a questão das prioridades e políticas adotadas no Brasil.
Por um lado concordo que as questões administrativas não podem ser deixadas de lado pelo governo, são necessárias para dar vida ao organismo estatal e fazer as engrenagens do país andarem (mesmo com as constantes "engraxadas", parece que elas não andam). Lembrando Maquiavel, a ética política é sui generis. A administração não fica descolada das questões políticas, como seria o desejo de todos nós, imagino.
Neste ensejo lembro sempre da Lei Rouanet que tornou-se para mim a motriz da confusão entre prioridades e política. Me vejo confuso quando um filme brasileiro é financiado pelo governo federal e empresas estatais e ainda tenho que pagar R$ 20,00 para assistí-lo. Fico também confuso quando cantores pouco conhecidos ganham verbas na casa das centenas de milhares de reais com a justificativa de que parte dos CDs/DVDs serão distribuídos gratuitamente. Lembrando que estes CDs/DVDs são produzidos por grandes nomes do mercado fonográfico como BMG, Sony, etc.
OU SEJA, estamos diante de uma questão de prioridades. Acho muito bom que a cultura seja constantemente alimentada no Brasil, que novos artistas surjam e se criem oportunidades e empregos. Mas me parece que um país com cerca de 50 milhões de miseráveis (pesquisa FGV/SP) precisa menos de teatro do que comida.
OK. O governo deve administrar suas questões de forma balanceada, inclusive a projeto de lei da bancada evangélica carioca para a inclusão de templos religiosos como entidades a serem contempladas pela Lei Rouanet.
*Bruno Bolognesi é mestrando em Sociologia Política pela UFPR e pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira da mesma instituição.

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

[Opinião] Cansou do quê?

Lucas Castro*

O ainda incipiente movimento apelidado de "Cansei", o Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros, encabeçado por uma série de instituições de grande porte do estado de São Paulo, entre elas a OAB e a FIEP, vem causando algum rebuliço nas manchetes de grandes jornais (FDSP de 01/08/07, somente para assinantes), mas ainda não decolou. Tem por finalidade demonstrar a sensação de caos existente principalmente na aviação civil e na política e mobilizar a população brasileira em prol de seus direitos.

Entretanto, como sempre quando em terras tupiniquins, algo não está certo. Esse movimento iniciou-se com o deflagramento da crise aérea, notadamente, com o acidente da TAM (17/07/07). Inflamados pela mídia, inconformados com os problemas que já assolam a nação, os estratos médio e alto da sociedade brasileira “politizada” e “pensante”, entenda-se com isso, a camada média/alta de São Paulo, parte para o ataque. A partir daí, confunde-se corrupção, reforma política, falta de estrutura nos transportes rodoviários e aéreos, falta de investimentos em portos, super-simples, taxa de câmbio, variáveis macro-econômicas, juros, política monetária chegando até ao Itamaraty. Preocupações saudáveis e normais, claro. Mas não chegam a ser a preocupação e a bandeira da maioria de nossa população e nem podem ser defendidas como tais.

Em 2005, de acordo com o IBGE, 78,5% das pessoas ocupadas de 10 ou mais anos ganhava até 5 salários mínimos. Em 1999, a taxa de analfabetismo rondava a casa de 14% e apenas 52,8% dos domicilios tinham esgoto e fossa séptica (IBGE). Na minha reles opinião, não acho que esse estrato da população brasileira (não seria a maioria?) esteja interessado em como anda a aviação civil ou mesmo questões grandiosas da nação brasileira, como democracia direta, voto em lista fechada e taxa de câmbio. Antes, precisam pensar em questões mais básicas e de menor alcance, como por exemplo, sobreviver hoje à fome, violência, preconceito, percalços da vida ainda não ultrapassados por grande parte da população.

Em verdade, a questão é identificar quais problemas estruturais são mais sérios e prementes para o país: fome, miséria, educação e violência ou aviação civil, infra-estrutura viária e portuária. Quem deve vir antes, o ovo ou a galinha?

*Graduando em Ciências Sociais, advogado, membro do Grupo de Análise de Conjuntura da UFPR/NUSP.

Sucessão no Palácio 29 de Março.

Guatimozin de Oliveira Santos Filho*

E começa novamente a corrida pelo ouro, quer dizer, pela Prefeitura de Curitiba. O atual prefeito e declarado candidato à reeleição Beto Richa, vem colhendo os louros resultantes da sua política de “Faraó do sistema viário”, através dos altos índices de aprovação e baixos índices de rejeição da sua gestão. Na pesquisa espontânea realizada pelo Paraná Pesquisas/Gazeta do povo, o filho do ex-governador José Richa aparece disparado na frente em relação aos demais nomes citados pelos entrevistados na pesquisa espontânea realizada. Porém, tais resultados são muito prematuros e insuficientes para definir, desde já, o panorama do pleito eleitoral que será realizado ano que vem.

Dentre os fatores que podem, e provavelmente virão a chacoalhar este estável cenário, estão: a escolha de quem estará ao lado do atual prefeito, ocupando a posição de Vice, e também a mobilização das forças adversárias, que ainda não definiram a sua estratégia de ação. No primeiro caso, a presença de Gustavo Fruet ao lado de Richa poderá causar ecos não só no cenário político curitibano, mas também paranaense, tanto nos bastidores tucanos como no de muitos outros partidos até então declarados aliados. Já em relação às forças adversárias, podemos destacar a pré-candidatura de Gleisi Hoffmann (PT), que traz, colado à sua imagem, o surpreendente desempenho da eleição passada, na qual teve uma meteórica subida nas pesquisas de opinião e quase veio a desbancar o Senador, até então eleito pela opinião pública com larga diferença, Álvaro Dias. Rubens Bueno (PPS), com seu bom desempenho nas duas eleições anteriores (tanto nas municipais como estaduais) e sua política de “moralização da administração” e Ratinho Júnior (PSC), tendo o pai e também apresentador de TV Carlos Massa como principal cabo eleitoral, prometem também agitar a disputa. Já o PMDB, que tem como principais nomes o do ex-prefeito Rafael Greca e o do atual reitor da Universidade Federal do Paraná, Carlos Augusto Moreira, baterá de frente com alguns problemas. Entre eles, o “anonimato” do reitor, o alto índice de rejeição do ex-prefeito e a colagem da imagem do governador à candidatura, que aqui chamaremos de “Efeito Requião”, que da mesma forma que pode trazer muitos votos, pode tirá-los.

*Graduando em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Paraná, membro do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira.

terça-feira, 31 de julho de 2007

PANAMERICANOS: O QUE CUBA TEM QUE O BRASIL NÃO TEM?

Os jogos Pan Americanos suscitaram a discussão sobre o desenvolvimento do esporte no Brasil, especialmente os amadores, que dependem de uma política mais consistente de apoio. O bom resultado da delegação brasileira não deve ser encarado como garantia de sucesso nas olimpíadas, mas como uma ótima oportunidade de discutirmos como formamos e revelamos nossos talentos e o que devemos fazer para conquistar melhores resultados em competições de alto nível como às olimpíadas e campeonatos mundiais.
Os jogos Pan Americanos não dão a real idéia do nível de nossos atletas, basta ver o desempenho do Brasil nos últimos dois Jogos Olímpicos, quando conquistamos apenas 10 medalhas (5 de ouro) em Atenas 2004 e 12 medalhas (nenhuma de ouro) em Sydney 2000. Para efeito de comparação, se relacionarmos o PIB dos países com sua participação nas olimpíadas de 2004, temos o seguinte quadro:

Posição entre as economias por Posição no quadro de medalhas
1. Estados Unidos 1 º
2. Japão 5º
3. Alemanha 6º
4. China 2º
5. Reino Unido 10º
6. França 7º
7. Itália 8º
8. Espanha 20º
9. Canadá 21º
10. Brasil 16º
Fonte: Fundo Monetário Internacional e Wikipédia

A tabela nos mostra que sete dos dez primeiros colocados estão entre as dez maiores economias do mundo. Os outros foram Rússia 11ª economia do planeta, a Austrália (terceiro IDH) e Coréia do Sul 12º PIB. A baixa renda per capita pode ser uma justificativa para o desempenho abaixo da média, pois o Brasil têm o PIB grande devido a sua enorme população, mas proporcionalmente continua sendo pobre. Mas em Atenas ficamos atrás, além da China (relativamente bem mais pobre que o Brasil) da própria Rússia, de Cuba, Ucrânia, Romênia e Hungria países tão pobres como o Brasil (vale citarmos ainda o péssimo 53º lugar em Sydney). Podemos afirmar que China, Estados Unidos e Japão são muito populosos e teriam gente de sobra para desenvolver os esportes. É fato que os países com as maiores populações têm mais condições de formar atletas de ponta, mais gente praticando uma modalidade acirra a competição por melhores resultados e eleva o nível dos atletas. A tabela abaixo correlaciona medalhas de ouro por milhão de habitante em Atenas:

Colocação nas Olimpíadas por Medalhas de Ouro por Milhão de Habitante
1. Estados Unidos 0,11
2. China 0,024
3. Rússia 0,18
4. Austrália 0,85
5. Japão 0,12
6. Alemanha 0,17
7. França 0,18
8. Itália 0,17
9. Coréia do Sul 0,19
10. Reino Unido 0,15
11.Cuba 1,8
12. Ucrânia 0,19
13.Hungria 0,79
14. Romênia 0,36
15. Grécia 0,54
16. Brasil 0,026
20. Espanha 0,069
21. Canadá 0,092
Fonte: Almanaque Abril e Wikipédia

Como vemos o Brasil fica na frente apenas da China, perde inclusive para os outros países com grande PIB e que não tiveram desempenho tão bom, Espanha e Canadá e que têm grande população, mas tiveram bom desempenho, EUA, Rússia e Japão, além da China. O Brasil é o único da tabela que conjuga grande PIB e população e baixo desempenho. Por essa tabela ainda concluímos que o país teve nas últimas olimpíadas um desempenho 69,2 vezes pior do que o de Cuba. A Hungria foi 30,4 vezes melhor que o Brasil. A Romênia foi 14 a Ucrânia foi 7,3 e a Rússia 6,9. A China e a Rússia têm uma grande população. Alemanha, França, Itália, Reino Unido e Austrália são países proporcionalmente ricos, com grande renda per capita. Os Estados Unidos e o Japão têm as duas coisas. Então o que países como Ucrânia, Cuba, Hungria e Romênia têm que o Brasil não têm?
A formação dos atletas no Brasil está completamente equivocada. Ela é feita pelos clubes, na maioria falidos, e pelas prefeituras, onde a política de esporte depende da boa vontade dos prefeitos. Essa duas estruturas não têm condições ou simplesmente não às oferecem (no caso de algumas prefeituras) para o pleno desenvolvimento dos esportistas. Depois que os atletas são formados eles encontram realidades amadoras, o que impede que os mesmos sobrevivam apenas da prática de suas modalidades. Alguns ainda optam pelo exterior e é nesse ponto que vemos como nossas ligas profissionais são fracas. No futebol perdemos jogadores todos os dias para países como Turquia, Ucrânia, Rússia e Grécia. Dois jogadores da seleção Pan Americana de basquete masculino jogam na Lituânia. O ponta Giba da seleção de vôlei vai jogar na Rússia. Vejam não estamos falando de EUA, Alemanha, França ou Itália, mas sim de países tão pobres quanto o Brasil. Atemos-nos acima ao gênero masculino. No feminino a situação é bem pior. As equipes de basquetebol até pouco tempo eram patrocinadas por prefeituras e no futebol a mulher que quiser sobreviver da modalidade têm de ir obrigatoriamente para o exterior por que não há nada próximo a uma estrutura profissional no Brasil. E os esportes individuais, como natação, atletismo, judô, boxe, ginástica, tênis de mesa entre outros? Sem dúvida a situação dessas modalidades não é muito diferente se não for pior do que as mais tradicionais.
Mas então o que Ucrânia, Cuba, Hungria e Romênia têm? Conectaram educação ao esporte (outras países relativamente pobres, como China e Rússia também fizeram). Isso não é privilégio de países comunistas e ex-comunistas, EUA e Austrália fizeram o mesmo. Nessas nações a formação do atleta é feita na escola e vai até a universidade. Em alguns casos mesmo depois de profissionalizados os atletas continuam a utilizar as instalações universitárias para treinar. Algumas instituições nos EUA tornaram-se verdadeiros centros de formação de campeões olímpicos. Fazer isso no Brasil significa tirar de clubes e prefeituras a competência de formar esportistas e passar as escolas e universidades. Por exemplo, ao invés do município ter uma equipe de handebol várias escolas vão formar seus times, potencializando assim o surgimento de talentos. As prefeituras dariam sua contribuição cedendo instalações esportivas. Materiais esportivos e financiamento para a organização e participação em competições viriam de um fundo formado pelos três níveis de governo. Conectar esporte com educação significa no Brasil substituir uma dispersa formação de esportistas por uma consistente e centralizada política de esporte. O estado de falência do esporte profissional no Brasil foge da competência governamental, mas um amplo programa de desenvolvimento esportivo já seria uma grande contribuição.
Como vimos acima dinheiro não determina tudo. Países tão pobres quanto o Brasil têm tido reiteradamente melhores resultados em competições de alto nível. Vontade política e projetos de longo prazo, que perpassem governos e colorações partidárias são a chave para termos desempenhos melhores. Esta aí uma coisa que vale a pena gastar 4 bilhões de reais.

André Barsch Ziegmann é mestrando em Ciência Política na UNICAMP