Satiagraha e a democracia
Vamos ao seu texto:
"O que temos até agora de concreto contra a maneira como o delegado Protógenes Queiroz comandou a Operação Satiagraha? [...]
1. Temos que ele usou nas investigações agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o que é ilegal. O uso dos agentes pode até mesmo remeter para o lixo parte do trabalho feito pelo delegado.
2. Temos que ele pediu a prisão de uma jornalista que publicou reportagem sobre a operação antes de ela ser deflagrada. O juiz De Sanctis recusou o pedido. Entendeu que a jornalista exerceu seu papel.
3. Temos que o delegado, em seu relatório inicial, dissertou sobre assuntos alheios à operação, se perdendo em considerações desnecessárias e algumas estapafúrdias.
4. E temos que ele escondeu informações dos seus superiores por não confiar neles. Desrespeitou a hierarquia.
Pois bem: aos olhos do distinto público, o que pesa até aqui contra o delegado parece irrelevante para condená-lo à execração. Ou mesmo para que ele seja punido.
Queiroz provocou a prisão de notórios personagens suspeitos de terem se envolvido em tenebrosas transações - e é isso o que conta a se dar ouvidos à voz rouca das ruas.
A libertação relâmpago de tais personagens reforçou o sentimento coletivo de que ricos e influentes neste país conseguem ficar impunes.
Contra sua vontade, o governo criou um herói que se populariza rapidamente - o mais destacado inimigo da corrupção no país e, por fim, um injustiçado. Que teve seus instrumentos de trabalho apreendidos e seus endereços vasculhados por ex-colegas.
Queiroz deveria agradecer aos seus desafetos."
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Está claro. De um lado, um delegado justiceiro que passou por cima de protocolos e regras profissionais para conduzir sua investigação. De outro, um governo e uma máquina permeada por interesses escusos, por práticas consagradas de bloquear investigações e que consegue virar a mesa com um piscar de olhos. No juridiquês e na formalidade da lei, Queiroz estará frito. No julgamento do público, estará a salvo. O que fazer? Aceitar o Direito ou a vontade do povo? E se ambos (regras e opinião da população) constituem os pilares da democracia, então aí está um dilema.
Quem prevalece é o Direito. Porque o povo (está guardado nas regras), só se manifesta quando lhe é permitido formalmente (em eleições, em alguns Conselhos), não em qualquer fórum e qualquer decisão. Daí que estejamos diante de um dos limites do regime.