Oliver Williamson: a relevância das instituições
[Roland Halbe, The Cooper Union
in New York, designed by Thom Mayne]
Valor Econômico, edição de 14 de outubro de 2009, página A14
in New York, designed by Thom Mayne]
Valor Econômico, edição de 14 de outubro de 2009, página A14
Por Decio Zylbersztajn
Seu trabalho nos convida a estudar as organizações na sociedade, como elas são.
A premiação do Nobel de economia de 2009 coincide com uma celebração que ocorrerá na Universidade de Chicago em dezembro. Trata-se da comemoração dos 99 anos do professor Ronald Coase. Alguém poderia certamente indagar, qual a relação entre o novo laureado e o professor Coase, que recebeu o mesmo prêmio em 1992.
Na verdade o Nobel foi destinado a dois pesquisadores, Oliver Williamson e Elinor Ostrom, que dividem uma base comum que foi introduzida por Ronald Coase. Tal base se sustenta no fato de que as instituições são importantes e voltaram a fazer parte da teoria econômica. Foi Coase quem convidou os economistas a modelar o mundo real ao invés de brincar com modelos afastados da realidade. Assim afirmou no seu discurso de premiação.
Se Coase apontou para a direção correta, foi Oliver Williamson quem desenvolveu o construto fundamental para que, todos nós que estudamos a Economia das Organizações, pudéssemos fazer análises pautadas por modelos realistas. Oliver Williamson trabalhou incansavelmente por quatro décadas apresentando o seu modelo que permite testar hipóteses sobre os mecanismos de governança das organizações, sobre as relações entre firmas que não ocorrem por meio de mercados e sim dos contratos. Se o termo “custo de transação” é hoje tão comum, devemos a ambos, Coase e Williamson, respectivamente, a sua criação e difusão.
Mais do que o conceito de governança corporativa, o trabalho de Williamson lançou luz sobre decisões estratégicas fundamentais, como por exemplo, a decisão estratégica sobre o crescimento vertical das organizações. Um passo além da questão tradicional que permeia as decisões estratégicas sobre “terceirização”, o modelo de Williamson abriu caminhos para a análise do crescimento das firmas e das relações contratuais complexas que caracterizam as cadeias produtivas e as redes de corporações modernas.
Williamson abriu caminhos e determinou rupturas. Por exemplo, a tradicional visão da análise econômica da concorrência foi criticada por Williamson, que sugere que em muitos casos as intervenções das organizações de promoção da concorrência geram ineficiências indesejáveis nas organizações. Incomoda a muitos quando considera a firma, como que um tribunal de primeira instância para dirimir conflitos. Também incomodou muitos ao expor as entranhas do comportamento humano explorando o conceito de “oportunismo” dos atores da sociedade. Afirma Williamson que mesmo que você, leitor, não seja oportunista, o seu vizinho pode ser. Ou você pode agir oportunisticamente vez ou outra, o que traz implicações para o modelo das organizações e para a realização das transações.
Incomodou também quando reapresentou o conceito de “racionalidade limitada” gerado por Simon e revivido na obra de Williamson, que colide com a hiperacionalidade que caracteriza a teoria econômica tradicional. Ou seja, temos a intenção de agir racionalmente, mas nossa incompetência cognitiva é tamanha, que só conseguimos atingir parcialmente o nosso intento. Some-se o oportunismo, a racionalidade limitada e a necessidade de realizarmos contratos, para compreendermos como as instituições são necessárias para evitar o caos social e econômico, como o que se instalou no mundo no final de 2008 e ao longo de 2009.
Seus críticos são tão numerosos quanto os seus admiradores. Alguns afirmam que o seu modelo não reconhece a estrutura social que abriga as complexas transações. Outros o criticam pelo excessivo reducionismo dos seus modelos de determinação das estruturas de governança eficientes. Outros implicam com a homogeneidade dos seus artigos, que sempre terminam com um mantra: existe um alinhamento minimizador de custos de transação, entre as formas de governança observadas, regido pela interação entre as características das transações e das instituições.
A sua contribuição fundamental iniciada nos anos 70 foi repetida mundo afora nas suas contínuas peregrinações por universidades em todos os continentes. No curso que costumava dar na Universidade de Berkeley que eu tive a oportunidade de fazer, Williamson iniciava com uma citação de Peguy que está no seu livro “Mecanismos de Governança” de 1996. Essa citação inspira a primeira aula da disciplina de Economia das Organizações que eu ministro na FEA: “Quanto mais eu vivo menos acredito em iluminações súbitas, que não venham acompanhadas por trabalho sério. Menos eu creio nas súbitas paixões e mais eu creio na eficiência do trabalho modesto, lento, molecular e definitivo. Quanto mais eu vivo, menos acredito nas revoluções sociais, improvisadas e maravilhosas, com ou sem armas e ditadores, e mais eu acredito na eficiência do trabalho modesto, lento, molecular e definitivo.”
Vejo em Williamson um exemplo de cientista social sério e cuja obra impactante abriu caminhos que ainda estamos a explorar. (...) Seguindo a tradição coasiana, seu trabalho nos convida a estudar as organizações na sociedade, entre as quais as firmas, como elas são, e não como queremos que sejam. Se alguns ainda viam a Nova Economia Institucional como uma teoria menor que apenas critica a teoria econômica tradicional, o chamado “mainstream”, creio que depois de Ronald Coase, Douglass North, e agora Oliver Williamson e Elinor Ostrom, é chegada a hora de repensarmos as disciplinas dos cursos de Economia, de Administração e de Direito, Trazendo um pouco da visão coasiana.
O professor Ronald Coase será homenageado em dezembro. Vive para ver os seus seguidores intelectuais ganharem a merecida relevância. Conforme afirmou: “O mundo real é o que realmente importa. Vamos pois estudá-lo.”
Decio Zylbersztajn é professor de Economia das Organizações da USP e organizador do livro “Direito e economia” (Editora Campus), que contém capítulo escrito por Oliver Williamson.
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