terça-feira, 31 de julho de 2007

PANAMERICANOS: O QUE CUBA TEM QUE O BRASIL NÃO TEM?

Os jogos Pan Americanos suscitaram a discussão sobre o desenvolvimento do esporte no Brasil, especialmente os amadores, que dependem de uma política mais consistente de apoio. O bom resultado da delegação brasileira não deve ser encarado como garantia de sucesso nas olimpíadas, mas como uma ótima oportunidade de discutirmos como formamos e revelamos nossos talentos e o que devemos fazer para conquistar melhores resultados em competições de alto nível como às olimpíadas e campeonatos mundiais.
Os jogos Pan Americanos não dão a real idéia do nível de nossos atletas, basta ver o desempenho do Brasil nos últimos dois Jogos Olímpicos, quando conquistamos apenas 10 medalhas (5 de ouro) em Atenas 2004 e 12 medalhas (nenhuma de ouro) em Sydney 2000. Para efeito de comparação, se relacionarmos o PIB dos países com sua participação nas olimpíadas de 2004, temos o seguinte quadro:

Posição entre as economias por Posição no quadro de medalhas
1. Estados Unidos 1 º
2. Japão 5º
3. Alemanha 6º
4. China 2º
5. Reino Unido 10º
6. França 7º
7. Itália 8º
8. Espanha 20º
9. Canadá 21º
10. Brasil 16º
Fonte: Fundo Monetário Internacional e Wikipédia

A tabela nos mostra que sete dos dez primeiros colocados estão entre as dez maiores economias do mundo. Os outros foram Rússia 11ª economia do planeta, a Austrália (terceiro IDH) e Coréia do Sul 12º PIB. A baixa renda per capita pode ser uma justificativa para o desempenho abaixo da média, pois o Brasil têm o PIB grande devido a sua enorme população, mas proporcionalmente continua sendo pobre. Mas em Atenas ficamos atrás, além da China (relativamente bem mais pobre que o Brasil) da própria Rússia, de Cuba, Ucrânia, Romênia e Hungria países tão pobres como o Brasil (vale citarmos ainda o péssimo 53º lugar em Sydney). Podemos afirmar que China, Estados Unidos e Japão são muito populosos e teriam gente de sobra para desenvolver os esportes. É fato que os países com as maiores populações têm mais condições de formar atletas de ponta, mais gente praticando uma modalidade acirra a competição por melhores resultados e eleva o nível dos atletas. A tabela abaixo correlaciona medalhas de ouro por milhão de habitante em Atenas:

Colocação nas Olimpíadas por Medalhas de Ouro por Milhão de Habitante
1. Estados Unidos 0,11
2. China 0,024
3. Rússia 0,18
4. Austrália 0,85
5. Japão 0,12
6. Alemanha 0,17
7. França 0,18
8. Itália 0,17
9. Coréia do Sul 0,19
10. Reino Unido 0,15
11.Cuba 1,8
12. Ucrânia 0,19
13.Hungria 0,79
14. Romênia 0,36
15. Grécia 0,54
16. Brasil 0,026
20. Espanha 0,069
21. Canadá 0,092
Fonte: Almanaque Abril e Wikipédia

Como vemos o Brasil fica na frente apenas da China, perde inclusive para os outros países com grande PIB e que não tiveram desempenho tão bom, Espanha e Canadá e que têm grande população, mas tiveram bom desempenho, EUA, Rússia e Japão, além da China. O Brasil é o único da tabela que conjuga grande PIB e população e baixo desempenho. Por essa tabela ainda concluímos que o país teve nas últimas olimpíadas um desempenho 69,2 vezes pior do que o de Cuba. A Hungria foi 30,4 vezes melhor que o Brasil. A Romênia foi 14 a Ucrânia foi 7,3 e a Rússia 6,9. A China e a Rússia têm uma grande população. Alemanha, França, Itália, Reino Unido e Austrália são países proporcionalmente ricos, com grande renda per capita. Os Estados Unidos e o Japão têm as duas coisas. Então o que países como Ucrânia, Cuba, Hungria e Romênia têm que o Brasil não têm?
A formação dos atletas no Brasil está completamente equivocada. Ela é feita pelos clubes, na maioria falidos, e pelas prefeituras, onde a política de esporte depende da boa vontade dos prefeitos. Essa duas estruturas não têm condições ou simplesmente não às oferecem (no caso de algumas prefeituras) para o pleno desenvolvimento dos esportistas. Depois que os atletas são formados eles encontram realidades amadoras, o que impede que os mesmos sobrevivam apenas da prática de suas modalidades. Alguns ainda optam pelo exterior e é nesse ponto que vemos como nossas ligas profissionais são fracas. No futebol perdemos jogadores todos os dias para países como Turquia, Ucrânia, Rússia e Grécia. Dois jogadores da seleção Pan Americana de basquete masculino jogam na Lituânia. O ponta Giba da seleção de vôlei vai jogar na Rússia. Vejam não estamos falando de EUA, Alemanha, França ou Itália, mas sim de países tão pobres quanto o Brasil. Atemos-nos acima ao gênero masculino. No feminino a situação é bem pior. As equipes de basquetebol até pouco tempo eram patrocinadas por prefeituras e no futebol a mulher que quiser sobreviver da modalidade têm de ir obrigatoriamente para o exterior por que não há nada próximo a uma estrutura profissional no Brasil. E os esportes individuais, como natação, atletismo, judô, boxe, ginástica, tênis de mesa entre outros? Sem dúvida a situação dessas modalidades não é muito diferente se não for pior do que as mais tradicionais.
Mas então o que Ucrânia, Cuba, Hungria e Romênia têm? Conectaram educação ao esporte (outras países relativamente pobres, como China e Rússia também fizeram). Isso não é privilégio de países comunistas e ex-comunistas, EUA e Austrália fizeram o mesmo. Nessas nações a formação do atleta é feita na escola e vai até a universidade. Em alguns casos mesmo depois de profissionalizados os atletas continuam a utilizar as instalações universitárias para treinar. Algumas instituições nos EUA tornaram-se verdadeiros centros de formação de campeões olímpicos. Fazer isso no Brasil significa tirar de clubes e prefeituras a competência de formar esportistas e passar as escolas e universidades. Por exemplo, ao invés do município ter uma equipe de handebol várias escolas vão formar seus times, potencializando assim o surgimento de talentos. As prefeituras dariam sua contribuição cedendo instalações esportivas. Materiais esportivos e financiamento para a organização e participação em competições viriam de um fundo formado pelos três níveis de governo. Conectar esporte com educação significa no Brasil substituir uma dispersa formação de esportistas por uma consistente e centralizada política de esporte. O estado de falência do esporte profissional no Brasil foge da competência governamental, mas um amplo programa de desenvolvimento esportivo já seria uma grande contribuição.
Como vimos acima dinheiro não determina tudo. Países tão pobres quanto o Brasil têm tido reiteradamente melhores resultados em competições de alto nível. Vontade política e projetos de longo prazo, que perpassem governos e colorações partidárias são a chave para termos desempenhos melhores. Esta aí uma coisa que vale a pena gastar 4 bilhões de reais.

André Barsch Ziegmann é mestrando em Ciência Política na UNICAMP

7 comentários:

Julio Gouvêa disse...

André, para entender melhor o que era para ser seus dois quadros, a interpretação é a seguinte?
"Quadro" Posição entre as economias por Posição no quadro de medalhas: o número à esquerda diz respeito à Posição entre as economias; e o número à direita refere-se à Posição no quadro de medalhas.
"Quadro" Colocação nas Olimpíadas por Medalhas de Ouro por Milhão de Habitante: o número à esquerda refere-se à Colocação nas Olimpíadas; e o número à direita diz respeito a Medalhas de Ouro por Milhão de Habitante.
Confere?

Bruno Bolognesi disse...

Azá Andrézinho. Aí sim: o PAN é do Renan.

Abçs

André Ziegmann disse...

Julio, confere. Sobre Cuba tenho que fazer uma errata. Cuba não conquistou 1,8 medalhas por milhão de habitante, mas 0,79. Mesmo assim continua tendo um desempenho bem melhor que o brasileiro.

Anônimo disse...

André... Você é uma enciclopédia ambulante...

Minha pergunta é retórica: quando alguma coisa vai ser feita nesse sentido?

Abraço!

André Ziegmann disse...

Angel,
Ainceramente não sei, se a saúde a educação e a infra estrutura foram abandonadas, mas não custa trocer........

Unknown disse...

André,

gostei de sua posição perante nossa ineficiência em desenvolvimento de atletas, compartilho de sua revolta e acredito que realmente devemos organizar ações apolíticas, com institutos e fundações de credibilidade que sejam fundamentadas em valores humanos, o que infelizmente não podemos esperar de muitos de nossos políticos.
Gostaria de seu contato (e-mail ou messenger), tenho algumas idéias para formação de atletas no Brasil, pois como vi em seu relato você é uma pessoa com bom conheciemnto na área e poderia contribuir com nosso projeto.

edgaroliveirasilva@yahoo.com.br

Unknown disse...

André,

gostei de sua posição perante nossa ineficiência em desenvolvimento de atletas, compartilho de sua revolta e acredito que realmente devemos organizar ações apolíticas, com institutos e fundações de credibilidade que sejam fundamentadas em valores humanos, o que infelizmente não podemos esperar de muitos de nossos políticos.
Gostaria de seu contato (e-mail ou messenger), tenho algumas idéias para formação de atletas no Brasil, pois como vi em seu relato você é uma pessoa com bom conheciemnto na área e poderia contribuir com nosso projeto.

edgaroliveirasilva@yahoo.com.br