quarta-feira, 28 de março de 2007

Reforma Política: o lugar do Congresso Nacional.

Lucas Fernando de Castro*

O Superior Tribunal Eleitoral, órgão de maior hierarquia quando o tema é eleições, e o Supremo Tribunal Federal, corte suprema brasileira, vêm, nos últimos seis meses, tomando às vezes de Congresso Nacional e por meio de suas decisões vêm alterando de uma forma nada democrática o contorno institucional da democracia brasileira ora num sentido, ora noutro.

Podemos citar como exemplo, dois casos.

O primeiro aconteceu quando da decisão do STF, em meados de dezembro último quando, derrubou a chamada clausula de barreira ou clausula de desempenho, prevista já na Lei 9.096/1995 – Lei Orgânica dos Partidos Políticos – no artigo 13[1]. O relator argumentou que os parlamentares eleitos por partidos que não ultrapassaram aquele óbice, não poderiam atuar de forma plena. Estes sofreriam três grandes restrições: i) não entrariam na divisão de 99% do Fundo Partidário; ii) teria apenas direito a um programa de dois minutos por semestre, referente propaganda partidária gratuita, e iii) atuação parlamentar encolhida, com proibição de ocupar cargos na mesa, participar de comissões, para citar exemplos. Chamou a baila, o princípio da igualdade para justificar a declaração de inconstitucionalidade do citado artigo, tirando todos os efeitos daquele dispositivo.

O segundo exemplo, mais próximo, refere-se a uma consulta ao TSE de autoria do Partido da Frente Liberal (PFL), que logo se tornará apenas Democratas (DEM), em que pergunta a quem pertenceria o mandato eletivo, se ao partido ou ao congressista, quando deparados com migração partidária, nas eleições proporcionais. A decisão de ontem, tomada por maioria (6x1), acabou por decidir que o mandato eletivo é, de fato, do partido político, tendo em vista a importância constitucional e no Código Eleitoral das agremiações políticas.

O que salta os olhos nestas duas decisões? A tão aclamada reforma política já está se operando, só que por meios nada democráticos. Vejamos.

No primeiro caso a Corte Suprema entendeu que a clausula de exclusão não estava de acordo com a Carta Política. Fazendo assim, acabou com a discussão e também com a possibilidade de, naqueles moldes em que estava instituída na Lei 9.096/1995, ser implementada novamente. Ainda mais, a discussão nem mesmo passou por nenhumas das Câmaras (Alta e Baixa), ou seja, ela se deu apenas nos gabinetes e nos labirintos do Judiciário brasileiro. Síntese: sem a participação do Congresso, nada democrático.

Também no segundo caso, a temática não passou pelo Congresso Nacional, não houve debate ou mesmo discussão. Quando menos se espera, está em vigor no país a fidelidade partidária, obrigando os congressistas a voltarem para o partido com o qual se elegeu. Ainda não se sabe nem como essa decisão irá funcionar na prática. Mais uma vez, a implementação de uma nova figura político-jurídica foi construída fora do processo democrático, sem sequer a mínima intervenção dos representantes populares (congressistas eleitos para o Legislativo).

Estes dois exemplos mais próximos de nós, já conseguem demonstrar que o Poder Legislativo passou para o terceiro plano, sobressaindo-se o Executivo seguido do Judiciário. Ao Congresso Nacional foi relegado um papel de figurante no processo legislativo pois o Executivo já não mais dele precisa (Medida Provisória); o Judiciário, que teria o papel de aplicador da Lei não somente a aplica, mas cria novas figuras (fidelidade partidária). Ao Legislativo foram relegados apenas os esquemas de corrupção, mensalões e o descrédito da população.

Nesse ínterim, nos perguntamos: qual é o papel do Congresso Nacional?

A resposta para tal pergunta não é fácil. Constatamos, apenas, que quanto mais o Congresso Nacional perde seu poder, mais a democracia representativa enfraquece e abrem-se brechas para ações autoritárias.

*Lucas Castro é bacharel em Direito, graduando em Ciências Sociais e pesquisador do GAC/NUSP.


[1] Art. 13 - Tem direito a funcionamento parlamentar, em todas as Casas Legislativas para as quais tenha elegido representante, o partido, que em cada eleição para a Câmara dos Deputados obtenha o apoio de, no mínimo, cinco por cento dos votos apurados, não computados os brancos e os nulos, distribuídos em, pelo menos, um terço dos Estados, com um mínimo de dois por cento do total de cada um deles.

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