terça-feira, 20 de abril de 2010

Como funcionam as eleições nos EUA

Resumidamente, as regras eleitorais nos EUA. Slides montados a partir de diversos sites e fontes.
Dúvidas, críticas e comentários são bem vindos.

As bases sociais do voto de Dilma e Serra

[Hugo Borghi, c. 1950. Jean Manzon. Pirelli/MASP]
Marcus Figueiredo (IUPERJ)
Site Carta Maior - 19-04-2010
As bases sociais do voto são sempre uma questão importante porque reflete a natureza das expectativas dos eleitores. Os candidatos em geral têm sempre os olhos voltados para a maioria, para garantir a eleição. Entretanto cada candidato não pode negligenciar as suas respectivas bases, sob pena de perdê-las. Este é um jogo de soma zero. Ao tentar avançar sobre uma classe de eleitores o candidato corre o risco de perder votos em uma classe concorrente. Definido então as diversas classes, categorias ou grupos sociais eles sempre terão demandas e interesses em disputas. É por esta razão que os candidatos tendem para a posição mediana entre os interesses conflitantes.
Esta convergência para a mediana produz discursos e propostas cujos resultados representam um denominador comum, com risco mínimo em desagradar as maiorias das posições conflitantes. Esta estratégia do denominador comum, por sua vez, tem como contra partida o aumento do risco de alta dubiedade, beirando a falta de posicionamento, posição mortal quando a taxa de conflito é muito alta. Exemplo claro está na disputa sobre o livre direito ao aborto. Nessas situações os candidatos preferem fugir do assunto. Este problema não existe nas eleições proporcionais dado que há espaço na disputa para posições conflitantes.
Tendo por referência a última pesquisa do instituto Sensus, vejamos as bases dos principais candidatos, Dilma e Serra.
Gênero
Hoje temos uma pequena maioria de mulheres frente aos homens. Esta categoria social passou a ser cobiçada pelos candidatos. Existem várias “teorias” sobre o comportamento eleitoral dos homens e das mulheres. As mais destacadas são as seguintes:
1. As mulheres são mais conservadoras do que os homens;
2. Hoje, se aceita que são as mulheres quem guiam o voto no seu lar, ao contrário do que ocorria no passado;
3. As mulheres que trabalham fora de casa comportam-se como os homens;
4. Mulher não vota em mulher;
5. A mulher, por ser “naturalmente” altruísta vota pensando mais no bem de seus filhos e de seus maridos.
6. As mulheres são mais cautelosas para decidir o seu voto;
Estas são afirmações tiradas de pesquisas qualitativas, difundidas entre políticos e assessores, cujas veracidades são duvidosas, quando não desconhecidas.
Neste quesito, Dilma leva vantagem entre os homens e tem igual perda entre as mulheres.
Gênero
Área de moradia
Considerando as áreas de moradia, Dilma ganha de Serra na área rural. Entretanto esta área representa apenas 15% do eleitorado. Esta presença na área rural certamente vem dos ganhos das políticas sociais.
Área de Modaria
Região
Nas regiões do país, Dilma leva vantagem em todas exceto no Sudeste. O destaque é para o Nordeste, região que mais se beneficiou com o programa Bolsa Família.
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Esta divisão territorial das intenções de voto reflete uma divisão política que floresceu na última eleição, quando Lula perdeu para o Alckmin nas chamadas áreas do agro negócio e de fronteira que sobem do interior de São Paulo e do Sul daí subindo pelo Centro-Oeste e Norte. Nessas regiões os ganhos de Dilma são modestos.
Educação e Renda
Considerando a educação, observamos um relativo equilíbrio entre Dilma e Serra nas posições baixas e médias. Na posição superior Serra tem ganho significativo. Entretanto, no indicador de renda observa-se uma divisão no eleitorado. A classe baixa, até 1 salário mínino, Dilma está levando vantagem sobre Serra. Este, por sua vez, está ganhando no ponto mais alto da pirâmide social, acima de 20 salários mínimos mensais. Nas posições intermediárias, de 1 a 20 SM há uma crescente vantagem de Serra.

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A comparação das bases sociais desses dois candidatos aponta para um horizonte de alta competição sobre políticas sociais entre Dilma e Serra. Nos indicadores de educação e renda, o apoio para Serra segue uma trajetória social de baixo para cima, Serra cresce segundo a posição social do eleitor. Dilma, ao contrário, decresce na escala social.
Esta situação aponta para as linhas ideologias das duas candidaturas. Dilma, como sucessora de Lula, tem enfatizado a continuidade do projeto PT-lulista que se concentra em políticas sociais de ascensão social, o que em nada agrada as classes médias-altas. Serra, como disse em seu discurso de lançamento de sua candidatura, acenou para o não confronto de classe, pregando a união de todos. Entretanto o seu eleitorado quer a volta de políticas mais liberais, cujo retorno social é perdas para as classes mais baixas na competição social.
Considerando a natureza do jogo eleitoral, de soma zero, o apelo de Serra para a união das classes, aponta para prospectos de políticas de “denominador comum” o que não combina com ele. Em algum momento ele terá que fazer uma opção ariscada: avançar sobre o eleitorado das classes médias-baixas, com políticas condizentes, o que, por sua vez, contraria as demandas de seu eleitorado típico.
Neste particular Dilma está confortável, pois o seu projeto PT-lulista é o quanto ela precisa para continuar ameaçando Serra, e em trajetória ascendente.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Os valores (políticos) dos jornalistas brasileiros

[Yale University Daily News. John Phillips, 1942.Life]

Daniel Marcelino*
Lucio Rennó**
Ricardo Mendes***
Wladimir Gramacho****

Resumo: Quais crenças e valores são compartilhados pelos jornalistas brasileiros? Os resultados desta pesquisa oferecem uma descrição dos primeiros dados disponíveis sobre as opiniões, crenças e valores dos jornalistas brasileiros e os contrasta com as preferências valorativas da população, ambos aferidos por meio de pesquisas de opinião pública. Os achados deste estudo apontam para um quadro bastante positivo sobre a forma como pensam os jornalistas entrevistados. O principal achado é a absoluta convicção entre jornalistas de que a democracia constitui a forma preferível de regime político. Também são discutidas questões como identificação partidária, preferência ideológica, avaliação da mídia e das instituições políticas nacionais. Enfim, mostramos aqui um quadro amplo sobre as opiniões e crenças dos jornalistas brasileiros em contraste com as opiniões da população.

Os meios de comunicação jogam papel central no funcionamento de regimes democráticos (Dahl, 2005) pois exercem uma função de investigação e divulgação do desempenho de atores públicos e privados que confere transparência ao sistema político. Os meios de comunicação também instruem e informam os cidadãos sobre o sistema político exercendo, portanto, uma função pedagógica essencial nas sociedades modernas. Como apontam vários autores que estudam o papel dos meios de comunicação e sua interface com a política, uma imprensa livre e autônoma é fundamental para o fortalecimento da democracia e para o exercício mais completo do controle social sobre o poder político (Lawson, 2002). Por último, em uma visão mais sociológica da democracia, baseada em uma interpretação discursiva da mesma, processos comunicativos são centrais para a formação de espaços públicos de deliberação e os meios de comunicação exercem papel central na construção dessas arenas (Avritzer e Costa 2004).

Contudo, afora editoriais de jornais e blogs – que normalmente representam a opinião da empresa, de uma coletividade, de uma organização ou apenas de um indivíduo –, não temos informações concretas sobre como pensam as pessoas que operam os meios de comunicação no Brasil como um todo. Editoriais e blogs não permitem generalizações sobre como pensa o universo de jornalistas no país. Um modo de se chegar a conclusões sobre essas opiniões é a realização de pesquisa de opinião pública com jornalistas, nos moldes das realizadas pelo The Pew Research Center for the People and the Press (http://people-press.org/) nos Estados Unidos. Até onde sabemos, não há pesquisas de opinião semelhantes no Brasil enfocando jornalistas. Dessa forma, não temos muitas informações, ao nível individual, sobre como pensam os jornalistas brasileiros acerca da política, economia e sociedade embasados em uma amostra que inclua jornalistas de todo o país e exercendo funções variadas na indústria da mídia.

Desvendar o que passa pela cabeça dos jornalistas é fundamental para entendermos suas aspirações, valores e crenças que, indiscutivelmente, influenciarão suas coberturas jornalísticas. Obviamente que distanciamento, fidedignidade, compromisso com o fato e imparcialidade são valores centrais no exercício da profissão. Mas o fato de termos opiniões pessoais e idéias consolidadas sobre o mundo impõe-nos lentes que orientam a leitura da realidade, podendo gerar vieses em nossas interpretações e descrições do mundo. Isso ocorre com qualquer profissional, e jornalistas não são diferentes. Assim, entender como as pessoas que produzem informação no Brasil pensam a sociedade, a economia e a política passa a ser fundamental para entendermos como e por quem essa informação é produzida.

As informações que apresentamos foram coletadas por intermédio de um questionário estruturado aplicado por telefone, com perguntas contendo alternativas de resposta pré-definidas, em uma amostra de 212 jornalistas de mais de 70 diferentes empresas distribuídas nas cinco regiões brasileiras. A amostra foi sorteada aleatoriamente usando uma estratégia de estágios múltiplos, que será discutida mais detalhadamente a seguir. Os dados coletados, portanto, permitem fazer inferências para o universo de jornalistas em atividade no Brasil. Uma amostra maior teria sido mais indicada, mas os dados dão uma ideia bastante fidedigna da diversidade de pensamento sobre os temas tratados na pesquisa e sobre as tendências gerais das visões de mundo desse setor."
[...]

Para acessar o artigo na íntegra, clique aqui.

* Mestrando no Centro de Pesquisa e Pós-Graduação sobre as Américas - CEPPAC - da UnB.
** Ph.D. em Ciência Política pela University of Pittsburgh. Professor Adjunto e Diretor do Centro de Pesquisa e Pós-Graduação sobre as Américas - CEPPAC - da UnB.
*** Mestrando em Ciência Política na UnB, é analista de pesquisas do Instituto FSB Pesquisa.
**** Jornalista e cientista político, é doutor em ciência política pela Universidade de Salamanca, diretor executivo do Instituto FSB Pesquisa e pesquisador associado do Centro de Estudos Avançados de Governo (CEAG) da UnB.

domingo, 11 de abril de 2010

Onde fica o Paraguai? Nota sobre uma ausência bibliográfica

[Série Chão e Céu, 2007. João Castilho. Pirelli/MASP]

José Szwako*

“Novas lideranças sulamericanas”, texto do professor Rafael Villa publicado na Revista de Sociologia e Política n. 32, é aberto com estas palavras: “A instabilidade política na região dos Andes tem chamado a atenção pela sua instabilidade ainda que a região do Cone Sul mais o Brasil (se excetuamos o Paraguai) tenda a apresentar mais estabilidade do ponto de vista político” (p.71). A julgar por essa disposição textual, o Paraguai se situa no Cone Sul, mas não apresenta a estabilidade política característica da região. Ao longo do texto, que gira ao redor de clivagens centrais para pensar as dinâmicas de estabilidade/instabilidade política no subcontinente como um todo, nosso vizinho guarani desaparece.

Esta ausência se repete em “Sociedad civil, esfera pública y democratización en América Latina: Andes y Cono Sur”, coleção que não reserva espaço para o caso paraguaio. Esses são apenas dois exemplos em um oceano bibliográfico sobre a América Latina e do Sul. Se procurarmos pela letra ‘pê’ no index de uma centena de livros e organizações, encontraremos ‘Partido...’ e, logo em seguida, Perón. Um prêmio de consolação pode ser encontrado nos sites do scielo Brasil e Chile: na busca pelo país, dentre vários artigos dedicados a microorganismos, bactérias e afins, são achadas reflexões sobre política recente, migração, e a Guerra contra o Paraguai, mas elas não passam de dez.

Não estou desfiando um rosário, nem penso que o Paraguai – “desde a Guerra!” – é injustiçado e, por alguma razão mística, merece atenção e análise. Essa ausência me interessa diretamente por conta da minha pesquisa, na qual estudo a relação de organizações feministas com o Estado paraguaio. De um ponto de vista bastante amplo, se nos voltarmos para as gerações e trajetórias de mulheres mobilizadas pelo e ao redor do feminismo, desde meados dos anos 1970, em quase todos os casos latinoamericanos (o caso paraguaio aí incluído), é sumamente instigante os fortes paralelos entre eles. Para mencionar apenas três deles, as divisões internas ao movimento, suas conquistas e limites se repetem nitidamente em vários exemplos da militância feminista. Quer dizer, do ponto de vista da análise conjunta dos feminismos, o Paraguai, em seus pontos convergentes e divergentes com os demais casos, está definitivamente plantado na América Latina.

O próprio texto de Rafael Villa traz ‘clivagens’ que espelham esse enraizamento: a vitória de Fernando Lugo, por exemplo, pode ser enquadrada adequadamente na “renovação de elites e Ascenso de esquerda de várias tonalidades” – e, diga-se de passagem, a coalizão com o Partido Liberal descolore bastante o caráter de esquerda do governo Lugo. Além disso, a base social sobre a qual se assentou tal renovação, ou seja, a série de vários movimentos sociais que impulsionaram a candidatura luguista, marca aquilo que Villa, na esteira de um Sader, chama de “entrada de novos atores políticos e sociais em cena”.

As fontes, objetos e níveis de comparação para espelhar frente ao caso paraguaio poderiam se multiplicar, seja com casos latinoamericanos ou não: a longa e triste reprodução do Partido Colorado lembra o exemplo mexicano do Partido Revolucionário Institucional e, em outro registro, as lógicas de produção ideológica em torno das figuras de Stroessner e de Stalin têm semelhanças nada superficiais. Em que medida essas comparações são adequadas, é pergunta a ser sistematicamente respondida. Que o Paraguai não seja um objeto consagrado e que sua política instável não mereça o adjetivo poliárquico, no entanto, não devem ser motivos para pensar nele como uma excepcionalidade de qualquer sorte.

*José Szwako é doutorando em Ciências Sociais na Unicamp.