GOVERNOS DE COALIZÃO OU FARRA DO BOI?
Nos últimos dias temos visto o PMDB dar um baile no governo para conseguir mais cargos na administração federal. A tática é simples, bloquear ou dificultar as propostas enviadas pelo governo ao congresso (pobre Mangabeira, que ficou sem pasta). Os acontecimentos dos últimos dias suscitam a discussão de como funcionam os governos de coalizão, no geral, e como esses são operados no Brasil.
A barganha por cargos existe em todas as democracias do mundo, faz parte, portanto, do jogo para formar maiorias. Não podemos nos esquecer que partidos existem para chegar ao poder (se as organizações não podem detê-lo totalmente, o partilham), e a materialização dessa função são as ocupações de cargos.
O problema é que no Brasil o troca-troca foge completamente da normalidade. A falta de uma burocracia efetiva, e a conseqüente existência de um absurdo de cargos que são preenchidos por indicação, tem como efeito deletério um funcionamento puramente fisiológico da coalizão. A opção por um funcionalismo de “confiança” e não de “carreira”, está na essência da formação das maiorias no país, pois, participar do governo, ocupando ministérios, secretarias e estatais torna-se interessante justamente pela possibilidade de através desses órgãos serem montadas redes clientelísticas, que vão beneficiar partidos, parlamentares e suas bases (prefeitos, vereadores e etc.).
Soma-se a esse fato a inexistência de um controle parlamentar do ministério. Como não há uma construção minimamente programática da coalizão, o gabinete não está comprometido com uma agenda de propostas a serem implementadas. Sendo assim, o ministério é desfeito por várias razões, que vão desde a eleição para as presidências da Câmara e do Senado, que dão nova configuração ao poder de barganha no Congresso, passando por reveses do partido do presidente e suas alianças nas eleições municipais, pois, se o chefe do executivo federal e sua organização não forem bons cabos eleitorais, os aliados venderão mais caro seu apoio no legislativo, chegando até crises políticas e a própria vontade do presidente. Nos regimes parlamentaristas e semi-presidencialistas, onde o gabinete emerge do parlamento, sendo condição para ocupar uma pasta ter sido eleito para o legislativo, se a coalizão não consegue executar um eixo mínimo de propostas, que amarraram dois ou mais partidos e possibilitaram a formação de uma maioria, o ministério pode ser desfeito e serem convocadas novas eleições para o parlamento. Obviamente que esses sistemas também são vulneráveis ao fisiologismo e a conveniências eleitorais, contudo, a possibilidade de dissolver o gabinete e o legislativo limita o troca-troca ministerial, e proporciona algum tipo de controle sobre o desempenho da coalizão em aprovar e executar políticas públicas.
As coalizões funcionam no Brasil, o problema é como e a que custo. A falta de uma burocracia efetiva e de um controle sobre o ministério transformou a formação de maiorias no Congresso numa farra do boi. As conveniências políticas sempre existirão, entretanto, a inexistência de um conjunto de propostas e metas, que permeassem todo o ministério e a maioria que lhe dá sustentação, de um funcionalismo de carreira, que não estivesse preso aos cargos pelos finos laços da indicação, e da possibilidade de dissolver a coalizão, caso essa não estivesse exercendo com eficiência suas funções, não empresta nenhum caráter programático aos governos multipartidários brasileiros, sendo esses formados apenas com base nas vantagens eleitorais e políticas que os partidos podem ter ao ocupar determinados cargos.